ZORBA O GREGO : DANÇANDO ENTRE APOLO E DIONÍSIO. CRÍTICA DE WAGNER CORREA DE ARAUJO NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.
Foi a partir de um estranho telegrama recebido de um simples minerador Georges Zorba, na iminência da Segunda Guerra Mundial, que o escritor grego Nikos Kazantzakis , poucos anos depois, escreveu seu romance Zorba O Grego(1942).
Este personagem, caracterizado por uma pureza de alma e uma alegria de viver, capaz de “agir como se a morte não existisse , ou agir pensando na morte a cada instante” tornou-se símbolo de uma dança libertária (sirtaki ) de afirmação da vida.
Imortalizado, assim, na literatura de Kazantzakis e no cinema (Michael Cacoyannis),chegou à Broadway (1983) e ao balé, na criação coreográfica de Lorca Massine (1988), com a partitura sinfônica de Mikis Theodorakis. E que teve a sua mais recente remontagem (2013) com o Ballet de Santiago, sob a segura direção artística de Márcia Haydée.
Quando o turista americano John (Lucas Alarcon) chega a uma aldeia da Grécia e se apaixona pela viúva Marina (Natalia Berrios), desperta um irado ciúme de seu rival Manolios (José Manuel Ghiso).
Até a chegada do expatriado Zorba (Rodrigo Guzmán) que , ao mesmo tempo, incita sonhos amorosos na velha cortesã Madame Hortense (Andreza Randisek) e se torna fator de equilíbrio entre os conflitos dramáticos de perspectiva trágica.
Na concepção coreográfica de Lorca Massine há um visível referencial da dialética de Nietzsche entre o apolíneo e o dionisíaco, presente no original literário. Aqui o estilo clássico, com seu rigor de sublimidade apolínea, se confronta com a pulsão dionisíaca de danças nativas gregas, num fluxo passional catártico entre Eros e Thanatos.
Ainda que perpasse um sotaque de grandiloquência melodramática decadentista numa narrativa de linearidade crepuscular ( à moda de boa parte dos balés épicos do período soviético),prevalecem o apurado senso plástico de uma cenografia(Jorge Gallardo) indutora da passagem do tempo e de uma cuidadosa execução de figurinos.
A trilha sonora (M.Theodorakis) de pontuados acordes “metasinfônicos”,entre cores instrumentais e quadros corais, inclui um solo para mezzo-soprano de idealizada tessitura para o inspirado pas-de-deux do segundo ato (Natalia Berríos/Lucas Alárcon).
A nuance melancólica, quase kitsch, do personagem de Andreza Randisek, tem um contraponto na enérgica gestualidade física e na singularizada entrega técnica/emotiva ao papel título por Rodrigo Guzmán.
Que , ao lado de um afiado elenco, especialmente nas cenas de conjunto masculino, é capaz de remeter ,na provocação de sua performance exuberante , à postura de Zorba como um alter ego do pensar rebelde de Nikos Kazantzakis, na metafórica inscrição em sua lápide :
“Não tenho nada a desejar, não tenho nada a temer, eu sou livre”.
Wagner Correa de Araujo
ZORBA O GREGO, COM O BALLET DE SANTIAGO, depois de SP. BH e RJ, se apresenta em Curitiba, Teatro Guaíra, 27 de julho, e Porto Alegre, Oi Araújo Vianna, dia 29 de julho.
Fotos, Patrício Melo
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