GLAUBER ROCHA, O DIRETOR QUE AMAVA VILLA-LOBOS: 50 ANOS DE "TERRA EM TRANSE". ARTIGO DE OSVALDO COLARUSSO NO BLOG DE ÓPERA & BALLET.
Há 50 anos “Terra em transe”, um filme que permanece atual
Entes estes dois filmes, em 1967, Glauber Rocha realiza mais uma obra prima: Terra em transe, ganhador do prêmio máximo do Festival de Locarno daquele ano. Passado num país imaginário, Eldorado, ele resolve o enigma do verdadeiro país imaginado utilizando páginas de Villa-Lobos (principalmente as Bachianas Nº3): sim, estamos no Brasil. O pretenso ditador, Porfirio Diaz, magnificamente interpretado pelo ator Paulo Autran, encontra suporte musical em páginas da ópera Il Guarany de Carlos Gomes. Seria Carlos Gomes, um colonizado? Este ridículo personagem, que fica o tempo todo segurando um crucifixo e soltando frases messiânicas, não só utiliza como cenário de sua casa as escadarias internas do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, mas no seu embate definitivo com o jornalista Paulo Martins (vivido por Jardel Filho) chega a encontrar suporte no Othello de Verdi (na voz de Mario del Monaco). As manipulações do dono das televisões Don Julio Fuentes (vivido por Paulo Gracindo, uma paródia de Assis Chateaubriand ou Roberto Marinho) e do líder hipócrita-populista Felipe Vieira (José Lewgoy) contra o bem-estar do povo que é retratado com o som de Villa-Lobos. Quanto ao ambiente decadente que envolve o jornalista supracitado e as tramoias todas aparecem no som quase que inócuo de Sérgio Ricardo, aquele que os créditos responsabilizam como autor da trilha sonora. Creio ser uma imprecisão: o embate musical verdadeiro acontece, no filme, entre Villa-Lobos e Carlos Gomes. Villa-Lobos voltaria a ser utilizado por Glauber Rocha em seu último trabalho premiado (melhor curta no Festival de Cannes), o curta que descreve o enterro de Di Cavalcanti (1976), até hoje censurado (apesar de estar disponível no youtube).
Atualidade de Glauber
Muito triste ver que a situação no nordeste do Brasil não mudou muito desde que os filmes de Glauber foram rodados por lá. E “Terra em transe”, rodado há 50 anos, pode ser usado como um eficiente retrato atual da nossa classe política. Glauber Rocha foi um dos maiores artistas nascidos neste país, e teve a sabedoria e cultura de se associar com o que de melhor a nossa música clássica tem a oferecer. Sua morte, se não foi provocada como muitos disseram, foi comemorada pelos que estavam no poder naquela época, os militares. Na versão de sua mãe, Lúcia Rocha, o filho “não morreu da vontade de Deus; morreu de uma doença chamada Brasil”. Até nisso ele continua atual.
Osvaldo Colarusso
Fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/blogs/falando-de-musica/glauber-rocha-o-diretor-que-amava-villa-lobos-50-anos-de-terra-em-transe/
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