PERGUNTAR NÃO OFENDE, POR QUE MARTHA ARGERICH E CLAUDIO ARRAU QUASE NÃO INTERPRETAM MÚSICA DOS SEUS PRÓPRIOS PAÍSES? ARTIGO DE ISAAC CARNEIRO VICTAL NO BLOG DE ÓPERA & BALLET.
Não estou falando de tocar uma peça ou outra, um dos melhores concertos para piano do século XX foi escrito pelo argentino Alberto Ginastera, peça estreada e primeiramente gravada pelo pianista brasileiro João Carlos Martins, mas nunca tocada por dona Martha.
Claudio Arrau no início da carreira esteve envolvido numa das primeiras execuções do concerto para piano de Carlos Chávez, sob direção do compositor, mas depois excluiu completamente essa peça de seu repertório, ao ponto de atualmente pouca gente saber que ele a tocou.
Pelo menos os solistas brasileiros que fazem carreira no exterior nunca deixaram de interpretar e gravar música brasileira. Aliás não conheço um caso similar ao desses dois no mundo da música clássica. Em defesa deles, exceto um apoio que Martha recebeu quando jovem de Perón para estudar no exterior, tanto o governo chileno quanto o argentino pouco fizeram para fomentar a carreira dessa dupla, ambos são plantas cultivadas na Europa. Mal os associamos aos compositores de língua espanhola, são virtuoses consagrados como intérpretes de Liszt, Chopin, Ravel ou Debussy.
Mas é possível fazer carreira na música clássica tocando bastante música latino americana gente, o quarteto Latino Americano está aí para provar. Mais importante conjunto de câmara da América Latina, se não fosse por eles nunca teria escutado obras maravilhosas como o quarteto de Julián Orbón os quartetos de Mario Lavista ou a versão para cordas do poema sinfônico "Cuauhnáhuac" de Silvestre Revueltas, pois dessas 3 peças, eles realizaram as únicas gravações comerciais disponíveis.
A raiz do problema está no culto ao virtuosismo e aos virtuoses e o fenômeno no qual o intérprete se torna mais importante que a música. Tanto faz se solista tal está tocando as mesma peça fazem 50 anos, ele as toca como ninguém, até pois tal músico passou uma vida inteira repetindo essas obras em concertos!
Por isso eu digo, uma intérprete como Alicia de Larrocha é muito mais artista que Arrau e Argerich. Nunca ela deixou de interpretar, ao lado de Mozart e Beethoven, por exemplo obras para piano e orquestra de Falla, Turina, Albéniz, Montsalvatge, Surinach ou Rodrigo, todas essas ela gravou, tocando num nível tão alto quanto a já citada dupla sul americana.
De fato é um fenômeno raro um pianista por exemplo como o australiano Geoffrey Tozer, artista que gravou a integral para piano e orquestra de compositores pouco ligados ao mundo pianístico como Ottorino Respighi e Roberto Gerhard. Quando vejo notícias de pianistas jovens realizando a enésima gravação de concertos de Mozart, Beethoven e Chopin, muitas vezes interpretações essas que não acrescentam nada a um mercado tão saturado, noto como esse culto aos virtuoses, ao invés de ser estimulante, está na verdade se tornando entediante!
Isaac Carneiro Victal.
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