A Menina das Nuvens, Teatro Municipal de São Paulo, 11/08/2011


Tem óperas que merecem ficar mofando na prateleira.


A história tem milhares de óperas que caíram no esquecimento. Ficam mofando em um arquivo e nunca mais serão encenadas. Muitas delas são musicalmente fracas, outras tem libretos ruins e vai por ai. No século XIX , se a ópera não agradasse ao público, as vaias eram certas. Hoje em dia quem fazer isso é politicamente incorreto, artista pode fazer o que bem entender no palco e somos obrigados a aplaudir. Muitas óperas ficaram relegadas a apenas uma récita, outras nem terminaram a primeira devido aos tomates jogados no palco.
  A obra do nosso querido Villa-Lobos é imensa, o homem compôs de tudo. Depois de compor alterava as partituras. Até hoje não existe um catálogo com uma edição crítica de sua obra. Dizem por aí que o nosso compositor mor compôs dez óperas, temos notícias de quatro delas, as outras seis ninguém sabe, ninguém viu.  Izath (1912/14), Yerma (1971),  Magdalena (1947) e A menina das nuvens são as quatro conhecidas. A menina das Nuvens estava mofando em alguma biblioteca, até que o maestro Roberto Duarte resolveu ressucitá-la.Nem precisava caro maestro. 
  Os nacionalistas vão reclamar do que vou escrever, os patriotas vão ficar enraivecidos e os chatos de plantão vão soltar marimbondos africanos, a verdade é uma só. Musicalmente a partitura é fraca, simples e sem nexo. O primeiro ato é longo e eterno em chatices musicais. O segundo é mais curto e mostra uma música sem inspiração. No terceiro ato vemos um pouco da genialidade de Villa-Lobos, com algumas belas melodias. Roberto Duarte compôs um prelúdio, com elementos musicais constantes na partitura e inseriu alguns textos para fechar a história. Tentou organizar a bagunçada obra de Villa-Lobos, A Menina das Nuvens só foi ressuscitada porque a composição é de um  famoso compositor brasileiro. Como ópera  ou aventura musical como o compositor a definiu ,merece ficar mofando em uma prateleira.    
   A Orquestra Sinfônica Municipal conduzida por Roberto Duarte apresentou excelente sonoridade , venceu as firulas da partitura com volume correto. A direção de William Pereira é impecável, entendeu o universo infantil da obra e o transpôs para o teatro. Leitura correta , simplista e coesa. Não inventou moda, seguiu fiel ao libreto.  Um dos melhores diretores de ópera da atualidade ,agraciado por este blog como o melhor diretor de 2010 e vencedor do prêmio Carlos Gomes. Os cenários são espetaculares e os figurinos acompanham a idéia central. Todos se entenderam e conseguiram realizar uma grande produção.
   Os solistas são experientes cantores do cenário lírico nacional. Gabriela Pace incorporou a personagem, atuou como uma menina pura e ingênua. Sua voz some em diversos momentos, muitas vezes soou pequena.  Seu timbre é delicado . Conhecedora do papel fez uma apresentação segura. Lício Bruno emprestou majestade ao seu personagem, Tempo foi forte , um vozeirão penetrante. A atuação de Homero Velho como Vento Variável foi de bom nível juntamente com todos os demais solistas.
  Aconteceu um milagre no Brasil. A produção é originária do Palácio das Artes - Fundação Clóvis Salgado de 2009, terra das alterosas . Os grandes teatros estão fazendo intercâmbio de óperas, isso reduz os custos e dá oportunidade de mais pessoas conhecerem o trabalho. Espero que essa prática torne-se rotina entre os teatros brasileiros. Tomara que milagres como esse continuem acontecendo.
Ali Hassan Ayache 

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