Récitas da montagem inédita no Rio serão nos dias 20 e 21 de outubro
No âmbito das comemorações do centenário de Nelson Rodrigues, a ópera Anjo Negro, de João Guilherme Ripper, baseada na peça homônima do dramaturgo, será encenada nos dias 20 e 21 de outubro, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Com direção cênica de André Heller-Lopes, o espetáculo fará sua estreia carioca interpretado pela OSB Ópera & Repertório, sob a regência do maestro Abel Rocha. A montagem é patrocinada pela Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro.
Composta em 2003, quando foi apresentada pela primeira vez em São Paulo, a ópera ganha nova versão com mudanças na música e na parte cênica. Compositor e diretor tiveram que rever todo o trabalho original para a montagem no Rio. Acompanhada originalmente por um pequeno conjunto de câmara, a ópera agora terá uma orquestra. "Ampliei a orquestração e reescrevi boa parte da ópera. Tornei algumas cenas mais ágeis, porque a correspondência entre os tempos dramáticos do teatro e da ópera me incomodava na versão original. Além disso, nove anos após a estreia, minha linguagem musical e a compreensão do texto do Anjo Negro mudaram", explica Ripper.
O mesmo amadurecimento artístico é defendido pelo diretor carioca André Heller. Ele acredita que esta será uma abordagem totalmente diferente da anterior, com uma nova visão, imposta também pela grandiosidade do espaço cênico: "O cenário, por assim dizer, está pronto. É um absoluto desafio para mim, Fábio Retti (luz) e Marcelo Marques (figurinos) sairmos de uma obra gigantesca como o Anel do Nibelungo e mergulharmos numa estética totalmente diferente. A ideia é explorar ao máximo a direção de atores e todo o espaço - inclusive a piscina".
Escrita em 1946, a peça Anjo Negro aborda questões como racismo, crime, estupro e incesto, misturando realismo com referências à mitologia e ao teatro grego. Ismael, médico negro, mantém Virgínia, sua esposa branca, confinada em casa. Os filhos que nascem acabam afogados em um tanque, mortos por Virginia por serem negros como o pai. No dia do último enterro, Virgínia aproveita a ausência do marido para levar ao seu quarto Elias, meio-irmão de Ismael, branco e cego, a fim de ter um filho que não fosse negro. Ao retornar à casa, Ismael é informado do que ocorreu pela tia de Virgínia, que a odeia e que a tudo assistiu. Ismael obriga Virgínia a atrair Elias e o mata.
Um corte temporal na peça leva a história a 16 anos depois, quando aparece Ana Maria, branca e cega, apaixonada por Ismael, que acredita ser seu pai e o único homem branco do mundo. Ismael, também envolvido com Ana Maria, constrói um mausoléu para trancar-se com ela e protegê-la do desejo dos outros homens. Antes de expulsar Virgínia de casa, dá à mulher a chance de contar a Ana Maria toda a verdade. Virgínia fracassa, mas consegue convencer Ismael de que seu amor e ódio são maiores do que este mundo. Ismael tranca Ana Maria sozinha no mausoléu. Virgínia e ele permanecerão juntos para sempre, gerando filhos negros que morrerão afogados no tanque.
No elenco da montagem carioca, que terá três atos e cinco cenas, estão os solistas Luisa Francesconi, no papel de Virgínia, Ruth Staerke, que interpreta a tia, David Marcondes como Ismael e Marcos Paulo, que vive Elias. Além deles, Dafne Boms, Michele Menezes, Maíra Lautert, Flavia Fernandes, Carolina Faria, Frederico de Oliveira, Fabrizio Claussen e Murilo Neves compõem o cast.
O palacete, que hoje abriga a EAV, foi construído na década de 20 para ser a residência da cantora lírica italiana Gabriella Bensazoni e do empresário carioca Henrique Lage. Na época, o casal transformou o casarão em palco de reuniões sociais, festas e sarais que movimentavam a alta sociedade do Rio de Janeiro.
A parceria entre João Guilherme Ripper e André Heller-Lopes nasceu em março de 2000, quando estrearam a ópera "Domitilla", baseada nas cartas de amor trocadas entre D. Pedro I e a Marquesa de Santos. Em julho de 2003, apresentaram a primeira versão de Anjo Negro, em São Paulo e, em abril de 2012 foi a vez de "Piedade", que retrata a tragédia envolvendo Euclides da Cunha, sua esposa Ana da Cunha e o militar Dilermando de Assis.
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