A ÓPERA E A PONTE AÉREA : PERSPECTIVAS PARA A CENA LÍRICA EM SP E RJ. ARTIGO DE LEONARDO MARQUES NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.

Enquanto o Municipal de São Paulo vende assinaturas, no Rio paira a incerteza.

 ponte-aérea-600

O Theatro Municipal de São Paulo detalhou no dia 23 de maio a sua temporada lírica de 2013, divulgando ao público datas, artistas e divisão exata dos elencos para os títulos anunciados no começo do ano. A temporada da casa paulistana contempla um total de seis óperas (as cinco citadas abaixo, salientando que conto o programa duplo como uma só, mais The Rake’s Progress – A Carreira do Libertino –, que estará a cargo, já neste mês de junho, da Orquestra Experimental de Repertório). Você encontra alguns desses detalhes aqui no www.movimento.com, em matéria de Marco Antônio Seta; e a divisão exata dos elencos pode ser consultada no link abaixo:
http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/theatromunicipal/noticias/?p=12500

Não satisfeita, a casa de ópera paulistana, desde o início do ano comandada por José Luiz Herencia e John Neschling, começou a vender em 03 de junho assinaturas variadas para a temporada – prática bastante salutar, adotada por qualquer teatro decente do mundo. E, ciente da pobreza lírica que impera no Rio de Janeiro nos últimos anos, a dupla de diretores mandou publicar um anúncio de mais de meia página na edição do jornal carioca O Globo do dia 28 de maio, chamando a atenção do público interessado do Rio para as óperas que compõem suas séries de assinaturas: Aida, Don Giovanni, Cavalleria Rusticana/Jupyra, O Ouro do Reno e La Bohème.
Das prometidas três produções de teatros estrangeiros, apenas Don Giovanni vem do Municipal de Santiago do Chile. Aida e La Bohème, ainda que dirigidas cenicamente por estrangeiros, serão produções próprias da casa paulistana, devido aos custos elevados para a importação de montagens.
Neschling já pensa no futuro, e promete para o próximo ano um mínimo de dez óperas. Não sei se chega a tanto, mas o maestro é teimoso (na melhor acepção do termo) e perseverante, e não há dúvidas de que ele tentará cumprir a palavra, ou pelo menos se aproximar bastante deste número de montagens.

Enquanto isso, no Rio…

Já o Theatro Municipal do Rio de Janeiro começou o ano anunciando Isaac Karabtchevsky como seu novo diretor artístico. Por sua vez, o maestro já chegou mostrando seu cartão de visitas: anunciou três títulos líricos de grande interesse, todos pautados em importantes efemérides: Aida (200 anos de nascimento de Verdi), A Valquíria (200 anos de nascimento de Wagner) e Billy Budd (100 anos de nascimento de Britten).
Como pontos negativos, a temporada foi divulgada apenas parcialmente (até julho) e incluindo nada mais que três óperas. Ainda assim, mais duas boas notícias deram uma impressão inicial de que a casa carioca finalmente tomava jeito e se tornava um pouco mais organizada. Primeiramente, alguns títulos para 2014 já foram adiantados (Wozzeck, em abril, e Capriccio, em agosto) – e, convenhamos, um anúncio com tal antecedência representa uma quase revolução no Municipal carioca.
E além desta pequenina revolução, ainda a se confirmar (já que só no ano que vem saberemos se o Municipal vai mesmo montar tais títulos), o Theatro começou a vender em março ingressos para todos os seus espetáculos próprios até julho – sinal de que, ao menos, não pretendia cancelar nenhum deles.
A união de títulos bem escolhidos com ingressos vendidos com a devida antecedência resultou no esgotamento de bilhetes para Aida e para o balé O Lago dos Cisnes, e vejam só: enquanto escrevo (3 de junho), faltam 44 dias para a primeira récita de A Valquíria com ingressos à venda (visto que a primeiríssima se dará no dia de aniversário do Municipal, sem venda de entradas), e restam apenas 123 lugares disponíveis para o dia 17 de julho (nos setores Balcão Simples Lateral e Galeria Lateral), 269 para o dia 19 (Balcão Simples Lateral, Galeria e Galeria Lateral) e 55 para o dia 21 (apenas na Galeria Lateral). Ou seja, não há qualquer dúvida de que os ingressos para A Valquíria também vão se esgotar com facilidade, e talvez com boa antecedência.
Tal sucesso, no entanto, corre riscos. O Municipal está enrolando demais para anunciar o complemento de sua programação – o que não é bom sinal. Há pouco mais de um mês, em sua crítica de Aida no site da Revista Concerto, o jornalista Nélson Rubens Kunze informou em primeira mão que o Theatro pretendia montar em setembro um programa duplo incluindo as óperas Suor Angelica e Erwartung, o que poderia aumentar as produções de óperas do ano de três (se acreditarmos que Billy Budd não corre riscos) para quatro, sempre lembrando que um programa duplo conta como uma produção só, obviamente.
A informação de Kunze é quente, pois há mesmo esta possibilidade, mas nuvens negras pairam sobre esta estranha dobradinha, e ainda não há a confirmação da produção. Ao mesmo tempo, “apareceu”, assim do nada, um concerto da Série Música e Imagem agora no mês de junho, que não estava previsto inicialmente. Nos dias 15 e 16, a OSTM, sob a regência de Sílvio Viegas, acompanhará o filme O Encouraçado Potemkin, que tem várias passagens de sinfonias de Shostakovitch, arranjadas por Frank Strobel. Quem acompanha minhas resenhas e artigos sabe que não tenho nada contra esta série; pelo contrário, sempre observei que ela leva um público novo e jovem ao Municipal. O que não sei bem é se o Theatro gasta com ela uma parte de seu orçamento que poderia ser investida em sua sempre diminuta temporada lírica.
Questionada formalmente por e-mail sobre quando o Theatro pretende anunciar o complemento de sua temporada, e também sobre a confirmação das produções de Suor Angelica/Erwartung e Billy Budd, a Assessoria de Imprensa da Fundação Teatro Municipal limitou-se a reiterar uma declaração dada por Isaac Karabtchevsky ao lançar a programação do primeiro semestre: “À medida que confirmarmos a participação de todos os solistas, anunciaremos os demais títulos do ano”. É possível que o anúncio saia até o final deste mês. Fiquemos de olho.
Até lá, persistirão este desagradável sentimento de incerteza e uma série de dúvidas: afinal, o Theatro Municipal do Rio tomou jeito ou não em relação à sua programação? No campo da lírica, apresentará apenas Aida e A Valquíria? Teremos três óperas com Billy Budd (o que ainda seria bem pouquinho e indigno da casa)? Ou quem sabe quatro se incluirmos também a dobradinha estranha citada ali em cima (o que continuaria sendo pouco, mas pelo menos já seria o dobro daquela pobreza que se viu no ano passado)?
E, já olhando lá na frente, quantas óperas teremos em 2014? Um número realmente digno (seis óperas, no mínimo) ou vamos perder de goleada para São Paulo? É normal, nos tempos atuais, o Rio montar menos óperas que São Paulo. O problema é perder de goleada como tem acontecido nos últimos anos e, pelo visto, vai continuar acontecendo. Tomara que eu esteja errado, mas não creio nisso, não.
Enquanto a administração do Municipal do Rio não cala a minha boca, e o único jeito de fazer isso é produzindo mais de quatro óperas por ano sem desculpas esfarrapadas para não o fazer, continuo considerando que a melhor saída para os amantes da lírica no Rio de Janeiro é a ponte aérea, com assinaturas (essa coisinha básica de teatro decente!) e tudo mais.

Leonardo Marques

Fonte: http://www.movimento.com/

Comentários

  1. e vamos ver como soa o elenco escolhido, será que usarão microfone?

    ResponderExcluir
  2. Como será este elenco estrangeiro? Bons tempos aqueles onde os Patronos do Theatro Municipal traziam grandes nomes da ópera para as temporadas.

    ResponderExcluir
  3. Bons tempos em que havia confiança na arte dos artistas do Theatro Municipal de SP e em que eles eram tratados, não como aspirantes eternos, mas sim como gente, como artistas experientes que são, como pais de família, cidadãos, eles que são os verdadeiros mantenedores morais da casa e que perpetuam sua existência, independentemente dos "sonhos" pessoais de tantos diretores e administradores que por lá passaram nos últimos tempos, e a despeito das tantas questões trabalhistas incorrigíveis.

    ResponderExcluir
  4. bom mesmo seria se os artistas brasileiros tivessem chances justas e não tivessem que suportar as máfias destas casas de ópera.
    Bons tempos em que ouvíamos vozes líricas brasileiras cantando papéis adequados e não como hoje, microfonadas para serem escutadas.
    Vamos analisar um fato, no passado se fazia mais óperas com menos dinheiro, hoje se faz menos com muito mais dinheiro.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. O problema é que hoje as orquestras tocam com um diapasão a 442 no passado era 436 a 440! Isso torna o som mais brilhante mas ao mesmo tempo menos harmoniosos e estridente!
      As casas de operas foram reestruturadas inadequadamente e os news arquitetos nao pensaram na acústica sacrificaram para pensar na estética.
      Maestros hoje em dia nao pensam nos cantores e querem somente aparecer e fazem gestos exagerados e dinâmicas entre forte e fortíssimo.
      Hoje todos estão acustamados a escutar gravações em cd e DVD onde a perfeição acústica é fora da realidade.
      Mas para seu conhecimento o Pavatotti sempre foi amplificado no MET

      Excluir
  5. só se for aqui no Brasil que os maestros descem a mão, já vi operas no exterior. Essa colocação sobre estarmos acostumados com gravações não cola, aqui também existem bons ouvintes e pessoas entendidas que assistem ópera. Vejo cantores cantando o que não devem, e existem vozes adequadas e boas para determinados papéis que ficam escondidas. Se as orquestras tocam a 442, não se esqueça que os cantores também estudam com esta afinação. A musculatura se acostumou desde o início.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas