LUIZ PAULO HORTA: UMA LEGENDA QUE SE FOI. ARTIGO DE MARCUS GÓES NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.

Conheci Luiz Paulo em meados da década de 60.
luiz-paulo-horta-600 
Foi-me apresentado por Maria Amélia Barretto, da ilustre descendência do escritor José Barretto,então minha colega de trabalho e hoje promotora pública, irmã da então mulher de Luiz Paulo, Cecília. Este nome é o da padroeira da música, o que foi sempre motivo de brincadeiras entre nós. Eu a chamava de “Santa Cecília”, a padroeira. Outra relação de nomes entre LP e a música é o nome de um de seus filhos, que se chama nada menos que José Mauricio…
Fui colega de LP na redação do “Jornal do Brasil” na década de 80, como crítico de dança e eventual colaborador como crítico e comentarista de música, e foi aí que afirmamos uma amizade baseada no mútuo conhecimento. Foi aí que pude conhecer a admiração incontida de LP por Bach, Mozart, Beethoven e Chopin , e sua aversão artística pelo público e profissionais que só enxergam à sua frente a ópera como principal atração da música. Ficava meio triste quando via alguém sentir maior atração pela Traviata que pelas Paixões de Bach ou pelas sinfonias de Beethoven.
Muitas vezes tentei convencê-lo de que gosto é gosto, principalmente quando ele se sentava ao piano e tocava embevecido um noturno de Chopin, um de seus favoritos. Eu o chamava de “pianeiro”, e ele ria, mais enchendo a casa de Botafogo com ornamentos exageradamente chopinianos… LP acabava aceitando meus argumentos, principalmente quando lhe emprestei uma gravação em LP´s do Tristão e Isolda. Passou um ano assobiando os motivos dessa ópera.
Luiz Paulo era um homem discreto, e não apreciava os exageros, tanto na vida comum quanto na música, e por isso não sentia especial gosto em ouvir os tonitroantes agudos de poderosas vozes italianas ou os “tutti” muito fortes de orquestras regidas por regentes apreciadores de grandes volumes.
Além da música, tinha especial paixão pela literatura, morrendo de amores por Machado de Assis, sem nem de leve suspeitar que seria membro da Academia Brasileira de Letras, fundada por Machado. Como este, preferia a sugestão, a impressão e as dúvidas à realidade apresentada nítida e delineada.
Em 1987, fizemos juntos a crítica de “Carmen” encenada no TMRJ: ele criticou a estreia com o mezzo norte-americano Isola Jones, que taxou de “a dama do lotação”, e eu escrevi sobre a segunda récita, cantada por uma maravilhosa Céline Imbert. As duas críticas lado a lado até hoje me emocionam.
Foi em 1989, com meu casamento com o soprano Leila Guimarães e minha consequente ida para a Europa, onde morei treze anos, que nos separamos, sem deixar de nos escrevermos e, de vez em quando, nos revermos. Quando retornei ao Brasil em 2002, reencetamos nossa convivência artística.
As duas últimas vezes em que o vi em um espetáculo sobre o qual iria escrever foi na ópera “Aida” no Palácio das Artes de Belo Horizonte em 2010, quando ele nos apresentou sua segunda mulher Ana Cristina, pois “Santa” Cecília fora para o céu, e recentissimamente também em uma “Aida” em 2013 no TMRJ. Nós sempre nos perguntávamos nos intervalos dos espetáculos “o que você está achando ?” .
Na “Aida” desta semana em São Paulo não nos encontraremos fisicamente, mas para mim lá estará, atento com sua canetinha, o meu querido amigo e mestre em tantas coisas. Sou capaz de escrever uma crítica em nome dele, tal era o conhecimento que tenho de suas preferências.
LUIZ PAULO DE ALENCAR PARREIRAS HORTA, uma legenda que se foi.
WOHL MIR DASS ICH JESUM HABE
MARCUS GÓES-AGOSTO 2013


Fonte: http://www.movimento.com/

Comentários

  1. Marcelo Lopes Pereira6 de agosto de 2013 às 09:31

    Sem dúvida nenhuma fará falta em nossa Cultura Musical, tão pobre e dominada por modismos e egos tolos...
    Seguem as minhas mais sinceras homenagens...
    No Sábado foi homenageado pela OSESP e no Domingo pela OSB lá na Sala São Paulo...

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas