HINO NACIONAL - MOTIVO DE ORGULHO NUM PAÍS CORRUPTO. ARTIGO DE OSVALDO COLARUSSO NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.
Hoje, dia da Pátria, fico pensando se temos muito que comemorar. Nas últimas semanas nosso país foi mais uma vez invadido de notícias que fazem qualquer autoestima patriótica andar em baixa: um presidiário continuar parlamentar por uma votação vergonhosa e corporativa de seus pares, a Lei Rouanet, que deveria servir de lei de incentivo à cultura ser usada para captação de milhões para desfiles de moda, um parlamentar condenado arranjando a vida com uma solução “Genoína” para ganhar R$ 26.000 por mês, sem contar as falhas da justiça que acabam dando liberdade a assassinos condenados (o jornalista Pimenta Neves por exemplo) e tantas outras barbaridades com as quais convivemos diariamente. Buscando alguma razão de se orgulhar por ser brasileiro no dia da Pátria encontrei uma: nosso Hino Nacional. Um Hino que rivaliza em termos de beleza e de estrutura aos melhores Hinos Nacionais do mundo, como o da França e da Inglaterra. Falar sobre ele e seu autor nos remete a fatos históricos que parecem fortalecer aquilo que é típico do Brasil: caminhos tortuosos que levaram a um bom resultado.
O compositor
Existe um livro editado no Rio de Janeiro em 1965 chamado “Francisco Manuel da Silva e seu tempo” de Ayres de Andrade que, em meio a uma redação confusa e uma organização muito ruim, nos fornece dados interessantíssimos sobre o autor da música de nosso Hino Nacional: Francisco Manuel da Silva. Sua história é em geral triste como a de muitos músicos brasileiros. Idealista e sonhador dedicou muitos anos de sua vida a algo que não lhe reverteu muita coisa do ponto de vista pessoal. Ele nasceu no Rio de Janeiro em 21 de fevereiro de 1795 e com quinze anos de idade torna-se discípulo do primeiro grande compositor brasileiro: José Maurício Nunes Garcia (1767-1830). Com a chegada do compositor austríaco Sigismund von Neukomm (1778-1858) em 1816 ( que segundo o historiador Laurentino Gomes veio ao Brasil como espião do ministro francês Talleyrand, o “Sarney” daquele país) Francisco Manuel amplia e diversifica seus aprendizados musicais. Em 1823, um ano depois da independência, o músico conseguiu um emprego de timpanista na orquestra da Capela Imperial, mas conseguiu dois anos depois passar a tocar violoncelo na mesma orquestra, cargo este que tinha uma remuneração superior. Esta orquestra foi extinta em 1831 e o compositor foi bem ativo na luta pela sua restauração que só ocorreu mais de uma década depois.
Documentos atestam sua atividade como regente de orquestra e como compositor de diversas obras sacras e vale a pena dizer que em 1834 Francisco Manuel da Silva foi nomeado regente titular da orquestra da Sociedade Filarmônica, organização que promovia concertos com trechos de óperas e algumas obras sinfônicas e que em 1841 é nomeado “Compositor de música” da Imperial Câmara. Apesar de uma intensa atividade ligada à ópera e à música sinfônica o músico compôs basicamente apenas obras sacras e hinos. Em 1855 ajudou a fundar o Conservatório de Música (atual Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro) sendo efetivado na cadeira de “Rudimentos de música, Solfejo e Noções de canto”. Faleceu no Rio de Janeiro em fevereiro de 1865.
Hino nacional por acaso
Francisco Manuel da Silva escreveu ao menos seis hinos, entre eles um Hino ao dia 7 de abril, que pelo enorme sucesso viria a se tornar por acaso o Hino Nacional Brasileiro. Sim, o Hino Nacional não foi pensado para se tornar o Hino Pátrio. A melodia hoje usada como Hino Nacional foi utilizada primeiramente para enaltecer a ação de Dom Pedro I em 7 de abril de 1831, quando o imperador abdicou o trono em favor de seu filho. O texto era de um tal Ovídio Saraiva de Carvalho e Silva e pela poesia podemos perceber que a melodia original deveria ter um ritmo bem diferente da que conhecemos. Ao que parece a composição da música é bem anterior, uma marcha escrita em 1822 para celebrar a independência, e não foi pensada originalmente para conter um texto. Durante o reinado de Dom Pedro II a música era executada sem texto em ocasiões oficiais, e para muitos era nosso hino, apesar de nunca ser oficializado como tal. O compositor americano Louis Moreau Gottschalk (1829 —1869), muito amigo de Dom Pedro II e que morreria de uma doença tropical no Rio de Janeiro, ficou tão surpreso com a qualidade do nosso hino que compôs em meados do século XIX uma obra que evidencia que a melodia era tratada na época como nosso Hino Nacional: “Grande Fantasia Triunfal Sobre o Hino Nacional Brasileiro”. Aliás, não foi a única vez que o compositor americano se utilizou da melodia de nosso hino. Uma de suas ultimas composições, “Marcha Solene Brasileira para Orquestra e Banda Militar com Canhão” também utiliza a melodia do Hino Pátrio em meio a tiros de canhão e fanfarras. Com o advento da República em 1889 o novo governo pensou num novo hino nacional. Houve um concurso ganho pelo compositor brasileiro Leopoldo Miguez (1850-1902), mas este novo hino veio a se tornar o Hino da República, mantendo-se a marcha de Francisco Manuel da Silva como o Hino Nacional em sua forma apenas instrumental. O texto que cantamos hoje em dia foi obra de um poeta parnasiano, Joaquim Osório Duque Estrada, que escreveu a poesia apenas em 1922. Foi só daí que nosso hino adquiriu o aspecto que conhecemos hoje.
Influência de Rossini
No início do século XIX a ópera italiana era frequentemente executada no Rio de Janeiro, e era tida como modelo da boa arte musical. Nos dados fornecidos pelo livro que já citei de Ayres de Andrade, vemos que obras do compositor italiano Gioachino Rossini (1792-1868) como Il barbiere di Siviglia (“O Barbeiro de Sevilha”) e La Cenerentola (“A Cinderela”) eram executadas com uma impressionante frequência. A primeira frase da abertura de La Cenerentola é sem dúvida o modelo para a melodia de nosso hino. Os ornamentos, apogiaturas e trilos, são típicos do estilo dos compositores italianos da época. Enfim, nosso hino, carrega uma influência do teatro lírico italiano, algo importantíssimo na época de sua composição na então capital do país. Sua estrutura formal é perfeita e, se as razões para nos envergonhar aparecem diariamente devemos pensar no nosso Hino Nacional como uma das expressões maiores da nossa capacidade de criar algo notável, mesmo tendo sido meio ao acaso. O arrepio que sinto quando ele é cantado nas manifestações, ou mesmo burlando as ordens da poderosa FIFA, é prova de que nosso Hino Nacional tem força, qualidade e vigor. Enfim, algo para se orgulhar.
Osvaldo Colarusso
Fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/blogs/falando-de-musica/
O compositor
Existe um livro editado no Rio de Janeiro em 1965 chamado “Francisco Manuel da Silva e seu tempo” de Ayres de Andrade que, em meio a uma redação confusa e uma organização muito ruim, nos fornece dados interessantíssimos sobre o autor da música de nosso Hino Nacional: Francisco Manuel da Silva. Sua história é em geral triste como a de muitos músicos brasileiros. Idealista e sonhador dedicou muitos anos de sua vida a algo que não lhe reverteu muita coisa do ponto de vista pessoal. Ele nasceu no Rio de Janeiro em 21 de fevereiro de 1795 e com quinze anos de idade torna-se discípulo do primeiro grande compositor brasileiro: José Maurício Nunes Garcia (1767-1830). Com a chegada do compositor austríaco Sigismund von Neukomm (1778-1858) em 1816 ( que segundo o historiador Laurentino Gomes veio ao Brasil como espião do ministro francês Talleyrand, o “Sarney” daquele país) Francisco Manuel amplia e diversifica seus aprendizados musicais. Em 1823, um ano depois da independência, o músico conseguiu um emprego de timpanista na orquestra da Capela Imperial, mas conseguiu dois anos depois passar a tocar violoncelo na mesma orquestra, cargo este que tinha uma remuneração superior. Esta orquestra foi extinta em 1831 e o compositor foi bem ativo na luta pela sua restauração que só ocorreu mais de uma década depois.
Documentos atestam sua atividade como regente de orquestra e como compositor de diversas obras sacras e vale a pena dizer que em 1834 Francisco Manuel da Silva foi nomeado regente titular da orquestra da Sociedade Filarmônica, organização que promovia concertos com trechos de óperas e algumas obras sinfônicas e que em 1841 é nomeado “Compositor de música” da Imperial Câmara. Apesar de uma intensa atividade ligada à ópera e à música sinfônica o músico compôs basicamente apenas obras sacras e hinos. Em 1855 ajudou a fundar o Conservatório de Música (atual Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro) sendo efetivado na cadeira de “Rudimentos de música, Solfejo e Noções de canto”. Faleceu no Rio de Janeiro em fevereiro de 1865.
Hino nacional por acaso
Francisco Manuel da Silva escreveu ao menos seis hinos, entre eles um Hino ao dia 7 de abril, que pelo enorme sucesso viria a se tornar por acaso o Hino Nacional Brasileiro. Sim, o Hino Nacional não foi pensado para se tornar o Hino Pátrio. A melodia hoje usada como Hino Nacional foi utilizada primeiramente para enaltecer a ação de Dom Pedro I em 7 de abril de 1831, quando o imperador abdicou o trono em favor de seu filho. O texto era de um tal Ovídio Saraiva de Carvalho e Silva e pela poesia podemos perceber que a melodia original deveria ter um ritmo bem diferente da que conhecemos. Ao que parece a composição da música é bem anterior, uma marcha escrita em 1822 para celebrar a independência, e não foi pensada originalmente para conter um texto. Durante o reinado de Dom Pedro II a música era executada sem texto em ocasiões oficiais, e para muitos era nosso hino, apesar de nunca ser oficializado como tal. O compositor americano Louis Moreau Gottschalk (1829 —1869), muito amigo de Dom Pedro II e que morreria de uma doença tropical no Rio de Janeiro, ficou tão surpreso com a qualidade do nosso hino que compôs em meados do século XIX uma obra que evidencia que a melodia era tratada na época como nosso Hino Nacional: “Grande Fantasia Triunfal Sobre o Hino Nacional Brasileiro”. Aliás, não foi a única vez que o compositor americano se utilizou da melodia de nosso hino. Uma de suas ultimas composições, “Marcha Solene Brasileira para Orquestra e Banda Militar com Canhão” também utiliza a melodia do Hino Pátrio em meio a tiros de canhão e fanfarras. Com o advento da República em 1889 o novo governo pensou num novo hino nacional. Houve um concurso ganho pelo compositor brasileiro Leopoldo Miguez (1850-1902), mas este novo hino veio a se tornar o Hino da República, mantendo-se a marcha de Francisco Manuel da Silva como o Hino Nacional em sua forma apenas instrumental. O texto que cantamos hoje em dia foi obra de um poeta parnasiano, Joaquim Osório Duque Estrada, que escreveu a poesia apenas em 1922. Foi só daí que nosso hino adquiriu o aspecto que conhecemos hoje.
Influência de Rossini
No início do século XIX a ópera italiana era frequentemente executada no Rio de Janeiro, e era tida como modelo da boa arte musical. Nos dados fornecidos pelo livro que já citei de Ayres de Andrade, vemos que obras do compositor italiano Gioachino Rossini (1792-1868) como Il barbiere di Siviglia (“O Barbeiro de Sevilha”) e La Cenerentola (“A Cinderela”) eram executadas com uma impressionante frequência. A primeira frase da abertura de La Cenerentola é sem dúvida o modelo para a melodia de nosso hino. Os ornamentos, apogiaturas e trilos, são típicos do estilo dos compositores italianos da época. Enfim, nosso hino, carrega uma influência do teatro lírico italiano, algo importantíssimo na época de sua composição na então capital do país. Sua estrutura formal é perfeita e, se as razões para nos envergonhar aparecem diariamente devemos pensar no nosso Hino Nacional como uma das expressões maiores da nossa capacidade de criar algo notável, mesmo tendo sido meio ao acaso. O arrepio que sinto quando ele é cantado nas manifestações, ou mesmo burlando as ordens da poderosa FIFA, é prova de que nosso Hino Nacional tem força, qualidade e vigor. Enfim, algo para se orgulhar.
Osvaldo Colarusso
Fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/blogs/falando-de-musica/
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