"O NAVIO FANTASMA ", DE WAGNER, ATRACOU NO THEATRO DA PAZ, EM BELÉM. CRÍTICA DE MARCO ANTÔNIO SETA NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.
Moderna e atraente montagem paraense exemplar para todo o Brasil !
A quarta ópera do compositor é baseada na obra de Heirinch Heine, “Memórias de Herr von Schnabelewopski” é uma novela de Wilhelm Hauff; a ópera estreou no Hoftheater de Dresden a 2 de janeiro de 1843, composição esta que levou apenas sete semanas, entre julho e agosto de 1841 para ser elaborada musicalmente. A abertura, que no gênero é a peça orquestral mais fina que o mundo conheceu depois das grandes “Leonoras” de Beethoven, foi escrita por Wagner depois de terminar toda a ópera.
É notável o trabalho de aprendizagem e de continuidade cênica que os ilustres diretores de palco convidados neste Festival de Ópera do Theatro da Paz vem realizando, através dos espetáculos. Neste particular, Caetano Vilela, experimentado diretor teatral, desenvolveu um trabalho de realce junto aos coralistas, submetendo-os à realização e projeção cênica digna no desenrolar do espetáculo, especialmente após o interlúdio que antecede o coro das fiandeiras, e da cena da tempestade. Numa obra em que o coro é extremamente importante, impôs-se o Coral Lírico, que além de se dedicar inteiramente em sua realização cênico-teatral, revelou a excelente preparação do maestro Vanildo Monteiro, habilidoso no manejo do potencial vocal que se encontra sob a sua direção (belas vozes líricas); merecendo um “bravo” pela sua capacidade de elaboração sobretudo na complexa escrita musical da cena inicial do 3º ato.
O diretor Caetano Vilela por sua vez, cônscio do enredo, onde Wagner insiste em que a música de seus dramas é apenas um aspecto (mesmo numa ópera onde o “gesamt kunswerk”, o conceito mesmo de “obra de arte total”, não estivesse ainda plenamente desenvolvido), codifica através de suas opções cênicas, quer nos solistas ou nos coristas, marcações sérias, verídicas e principalmente muito criativas. Na concepção cênica e na iluminação, ambas de sua autoria, deu solução muito pessoal e contemporânea, como na cena do 2º ato, ao final da balada de Senta, emaranhando-a na tecelagem das fiandeiras e nas luzes de neon durante o dueto com o holandês. Um aplauso a esse diretor pela imaginação e criatividade (aparições, feixes luminosos e outros predicados).
O regente Miguel Campos Neto, um talento local, demonstrou a partir da abertura, sua segurança e autoridade musical empenhando-se totalmente à frente da Orquestra Sinfônica do Theatro da Paz, cujo resultado foi muito satisfatório na precisão dos sopros de madeira e bem apoiados arcos para enfrentar os cromatismos, modulações e os temas condutores “leitmotiv” utilizados pelo compositor germânico.
O Holandês foi interpretado pelo barítono carioca Rodrigo Esteves estreante nesse papel. Emitiu graves bem apoiados e audíveis em seu monólogo “Die Frist ist um” e, no dueto “Wie aus der ferme…” com Senta, apresentou já uma maior descontração, até então não apontada ao entrar no palco. Foi visível o cantor dando o melhor de suas potencialidades, em tessitura híbrida, onde somente Hans Hotter ou Theo Adam (entre o baixo e o barítono) podem dar ao holandês uma dimensão aterradora, sem recorrer aos soluços melodramáticos. Encerrou o trio, com a amada e seu pai, já bastante à vontade no palco.
Na trágica figura de Senta, o soprano lírico Tati Helene enfrentou com garra o árduo papel wagneriano no qual é também estreante. Com inteligência, astúcia e sabedoria, trabalhou com diversos professores de canto (Carmo Barbosa, baixo-barítono paulista e tantos outros europeus) emoldurando a sua voz. Sua “performance” surpreendeu o público e não podemos deixar de reconhecer o seu empenho com a heroina de Wagner. De sua balada ao trio que encerra sua grande cena na primeira parte da ópera, foi eficiente e cuidadosa, projetando seguros agudos, com intensidade, ainda que hesitante na afinação em suas passagens dos médios aos agudos e, às vezes, às notas mais graves.
Daland, o capitão norueguês, pelo baixo russo Denis Sedov, obteve neste um grande intérprete. Voz plena, graves e centro de seu registro muito seguros, agudos bem alçados aliados à beleza timbrística. A atuação cênica do pai amoroso de Senta é convincente e a realização da sua ária “Mogst du, mei Kind” (My child, will you bid…) foi muito bela, bem como o dueto entre ele e o holandês: “Wie? ist’s moglich” ?…
Ricardo Tamura viveu o Erik. Voz grande, bem timbrada (de tenor lírico) apresentou-se como ciumento noivo de Senta que assiste, sem compreender, à transfiguração de sua bem-amada. Esse papel de tenor dramático pode ser vivido por um tenor lírico como Tamura e, esperamos vê-lo novamente por aqui em futuras montagens .
O timoneiro com função hedonista, na voz do também tenor lírico-ligeiro A. Wilson Azevedo, nos ofereceu bonita e lírica interpretação de sua canção, que introduz no “Navio” um elemento popularesco. Lançou um lindo si bemol na arcada de seu canto, contribuindo assim para o “cast”. A Marie escrita para contralto, porém, nada a ver com o verdadeiro contralto wagneriano, na voz do meiossoprano Jéssica Wisniewski revelou-se uma cantora de musicalidade e empenho cênico.
No primeiro ato, toda a intensa dramaticidade oriunda do aparecimento do sinistro navio com os seus mastros negros e velas cor de sangue ao som do tema do holandês nas trompas e trompetes, se projetou um belo veleiro com faróis em jogo de luzes impressionante. Esse cenário fixo coroa a caixa cênica englobando toda a área do palco, que por sua vez é a doca, por outra a sala das fiandeiras e após, o porto iluminado em noite festiva de Duda Arruk.
Os figurinos atemporais de Elena Toscano condizem com o drama e repare-se, por exemplo, que não há composição que não seja magnífica, e que a belíssima paleta de cores leitosa e vibrante, não acentue a competente produção consoante a apresentação desta 3ª e última récita de estreia do XII Festival de Ópera do Theatro da Paz.
Estão pois, de parabéns o Sr. Gilberto Chaves e sua equipe, bem como o Secretário de Cultura do Estado do Pará – Paulo Chaves Fernandes – pela manutenção deste festival que já está se consolidando como um dos melhores da América do Sul.
O Navio Fantasma será reapresentado hoje, às 20 horas e depois de amanhã, dia 25/9, também às 20 horas.
Escrito por Marco Antônio Seta, em 23 de setembro de 2013.
Inscrição sob nº 61.909 SP/MTB
Fonte: http://www.movimento.com/
A quarta ópera do compositor é baseada na obra de Heirinch Heine, “Memórias de Herr von Schnabelewopski” é uma novela de Wilhelm Hauff; a ópera estreou no Hoftheater de Dresden a 2 de janeiro de 1843, composição esta que levou apenas sete semanas, entre julho e agosto de 1841 para ser elaborada musicalmente. A abertura, que no gênero é a peça orquestral mais fina que o mundo conheceu depois das grandes “Leonoras” de Beethoven, foi escrita por Wagner depois de terminar toda a ópera.
É notável o trabalho de aprendizagem e de continuidade cênica que os ilustres diretores de palco convidados neste Festival de Ópera do Theatro da Paz vem realizando, através dos espetáculos. Neste particular, Caetano Vilela, experimentado diretor teatral, desenvolveu um trabalho de realce junto aos coralistas, submetendo-os à realização e projeção cênica digna no desenrolar do espetáculo, especialmente após o interlúdio que antecede o coro das fiandeiras, e da cena da tempestade. Numa obra em que o coro é extremamente importante, impôs-se o Coral Lírico, que além de se dedicar inteiramente em sua realização cênico-teatral, revelou a excelente preparação do maestro Vanildo Monteiro, habilidoso no manejo do potencial vocal que se encontra sob a sua direção (belas vozes líricas); merecendo um “bravo” pela sua capacidade de elaboração sobretudo na complexa escrita musical da cena inicial do 3º ato.
O diretor Caetano Vilela por sua vez, cônscio do enredo, onde Wagner insiste em que a música de seus dramas é apenas um aspecto (mesmo numa ópera onde o “gesamt kunswerk”, o conceito mesmo de “obra de arte total”, não estivesse ainda plenamente desenvolvido), codifica através de suas opções cênicas, quer nos solistas ou nos coristas, marcações sérias, verídicas e principalmente muito criativas. Na concepção cênica e na iluminação, ambas de sua autoria, deu solução muito pessoal e contemporânea, como na cena do 2º ato, ao final da balada de Senta, emaranhando-a na tecelagem das fiandeiras e nas luzes de neon durante o dueto com o holandês. Um aplauso a esse diretor pela imaginação e criatividade (aparições, feixes luminosos e outros predicados).
O regente Miguel Campos Neto, um talento local, demonstrou a partir da abertura, sua segurança e autoridade musical empenhando-se totalmente à frente da Orquestra Sinfônica do Theatro da Paz, cujo resultado foi muito satisfatório na precisão dos sopros de madeira e bem apoiados arcos para enfrentar os cromatismos, modulações e os temas condutores “leitmotiv” utilizados pelo compositor germânico.
O Holandês foi interpretado pelo barítono carioca Rodrigo Esteves estreante nesse papel. Emitiu graves bem apoiados e audíveis em seu monólogo “Die Frist ist um” e, no dueto “Wie aus der ferme…” com Senta, apresentou já uma maior descontração, até então não apontada ao entrar no palco. Foi visível o cantor dando o melhor de suas potencialidades, em tessitura híbrida, onde somente Hans Hotter ou Theo Adam (entre o baixo e o barítono) podem dar ao holandês uma dimensão aterradora, sem recorrer aos soluços melodramáticos. Encerrou o trio, com a amada e seu pai, já bastante à vontade no palco.
Na trágica figura de Senta, o soprano lírico Tati Helene enfrentou com garra o árduo papel wagneriano no qual é também estreante. Com inteligência, astúcia e sabedoria, trabalhou com diversos professores de canto (Carmo Barbosa, baixo-barítono paulista e tantos outros europeus) emoldurando a sua voz. Sua “performance” surpreendeu o público e não podemos deixar de reconhecer o seu empenho com a heroina de Wagner. De sua balada ao trio que encerra sua grande cena na primeira parte da ópera, foi eficiente e cuidadosa, projetando seguros agudos, com intensidade, ainda que hesitante na afinação em suas passagens dos médios aos agudos e, às vezes, às notas mais graves.
Daland, o capitão norueguês, pelo baixo russo Denis Sedov, obteve neste um grande intérprete. Voz plena, graves e centro de seu registro muito seguros, agudos bem alçados aliados à beleza timbrística. A atuação cênica do pai amoroso de Senta é convincente e a realização da sua ária “Mogst du, mei Kind” (My child, will you bid…) foi muito bela, bem como o dueto entre ele e o holandês: “Wie? ist’s moglich” ?…
Ricardo Tamura viveu o Erik. Voz grande, bem timbrada (de tenor lírico) apresentou-se como ciumento noivo de Senta que assiste, sem compreender, à transfiguração de sua bem-amada. Esse papel de tenor dramático pode ser vivido por um tenor lírico como Tamura e, esperamos vê-lo novamente por aqui em futuras montagens .
O timoneiro com função hedonista, na voz do também tenor lírico-ligeiro A. Wilson Azevedo, nos ofereceu bonita e lírica interpretação de sua canção, que introduz no “Navio” um elemento popularesco. Lançou um lindo si bemol na arcada de seu canto, contribuindo assim para o “cast”. A Marie escrita para contralto, porém, nada a ver com o verdadeiro contralto wagneriano, na voz do meiossoprano Jéssica Wisniewski revelou-se uma cantora de musicalidade e empenho cênico.
No primeiro ato, toda a intensa dramaticidade oriunda do aparecimento do sinistro navio com os seus mastros negros e velas cor de sangue ao som do tema do holandês nas trompas e trompetes, se projetou um belo veleiro com faróis em jogo de luzes impressionante. Esse cenário fixo coroa a caixa cênica englobando toda a área do palco, que por sua vez é a doca, por outra a sala das fiandeiras e após, o porto iluminado em noite festiva de Duda Arruk.
Os figurinos atemporais de Elena Toscano condizem com o drama e repare-se, por exemplo, que não há composição que não seja magnífica, e que a belíssima paleta de cores leitosa e vibrante, não acentue a competente produção consoante a apresentação desta 3ª e última récita de estreia do XII Festival de Ópera do Theatro da Paz.
Estão pois, de parabéns o Sr. Gilberto Chaves e sua equipe, bem como o Secretário de Cultura do Estado do Pará – Paulo Chaves Fernandes – pela manutenção deste festival que já está se consolidando como um dos melhores da América do Sul.
O Navio Fantasma será reapresentado hoje, às 20 horas e depois de amanhã, dia 25/9, também às 20 horas.
Escrito por Marco Antônio Seta, em 23 de setembro de 2013.
Inscrição sob nº 61.909 SP/MTB
Fonte: http://www.movimento.com/
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