AINDA HÁ JUÍZES EM BERLIM E TAMBÉM AINDA HÁ EXCELENTES PRODUÇÕES DE ÓPERA EM PORTO ALEGRE. CRÍTICA DE FERNANDO TARRAGO GOVERMANN DA ÓPERA A FLAUTA MÁGICA NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.
Parafraseando a famosa frase que se tornou lenda no mundo
jurídico, onde um moleiro desafiou um imperador, dizendo que não venderia seu
moinho, pois ainda havia juízes em Berlim, sendo portando um símbolo de tudo
que é independente e possível, atrevo-me a dizer que há excelentes produções de
ópera em Porto alegre. A prova disso foi a récita que tive a oportunidade de
assistir na data de 16/11/2013, às 21h, no Theatro São Pedro.
A ópera em dois atos de Mozart, libreto de Emanuel Schikaneder, a partir de várias fontes teve sua primeira apresentação em Viena em 30 de setembro de 1790. Portanto, é uma obra que combina muito com um teatro de câmara como é o São Pedro. Do ponto de vista hermenêutico a obra aborda a maçonaria, seus rituais, pois o próprio Mozart e Schikaneder eram maçons.
Tamino (tenor) decide salvar Pamina (soprano), filha da Rainha da Noite (soprano), das mãos de Sarastro (baixo) com a ajuda de uma flauta mágica. É acompanhado pela burlesca figura de Papageno (barítono), um caçador de pássaros. Tamino se convence de que Sarastro é de fato um alto sacerdote, dotado de benevolência e sabedoria, e, junto com Pamina, passa por testes antes de ser iniciado na sociedade de Sarastro. Enquanto isso, Papageno busca uma companheira, Papagena (soprano), que ele acaba conquistando. A Rainha da Noite e suas acompanhantes são vencidas pelo brilho do sol, e a ópera termina com um hino de louvor a Isis e Osíris.
A orquestra Unisinos Anchieta foi muito bem conduzida pelo regente Evandro Matté. Já na abertura foi possível perceber a precisão rítmica dos andamentos soando como se fossem relógios vienenses, mas com detalhes de matizes sonoros dando ênfase à dinâmica.
O cenário, apesar de simples, foi de extremo bom gosto, na linha das produções operísticas de vanguarda da atualidade. Um ator narrou a trama explicando ao público o que estava se passando no palco. A iluminação esteve muito bem, a cargo de Fernando Ochoa. Os figurinos de Anderson Souza seguiram a linha do cenário, destaques especiais para as roupas da Rainha da Noite, Papagena e Papageno e sua formidável alpargata verdade.
A última vez que assisti A Flauta Mágica foi no teatro do SESI, regente o excelente Cláudio Ribeiro , um dos maiores conhecedores do gênero lírico no Estado. Isso faz quase 15 anos. O Tamino, naquela ocasião, foi Juremir Vieira. Trata-se, portanto, de um cantor veterano nos palcos, com carreira internacional e vários prêmiosem concursos. Percebi
um grande amadurecimento na arte de Juremir, técnica sólida, afinação precisa e
matização do som bem efetuada. No início da ópera, no 'Zu hülfe! Sonst bin ich
verloren!" Sua voz soou heróica, encheu o teatro. A ária do retrato foi
muito bem cantada mostrando um controle respiratório muito grande, belo
fraseado, dando a ilusão de ser fácil uma ária que está entre as mais difíceis
do repertório operístico para tenor, pois apesar de não passar de um lá bemol
gravita numa tessitura extremamente aguda.
Carlos Rodriguez é um dos nossos maiores talentos. Podemos incluí-lo na categoria que o famoso tenor Lauri-Volpi, em seu livro Vozes Paralelas, intitula ator-cantor. Estar no palco para Carlos é como estar na sala de sua casa. Possui um carisma, uma empatia com o público, uma musicalidade e extremo bom gosto para cantar. Sua voz atingiu a maturidade e sua técnica se solidificou. Cantou muito bem todas as árias e conjuntos, mas como dito, o lado ator é seu ponto alto.
O grande destaque da noite foi o soprano Carla Domingues. Uma mulher com uma beleza exuberante que cantou as duas dificílimas árias das Rainha da Noite 'com um pé nas costas' como se diz no jargão popular. Carla é o que podemos chamar de um dramático de coloratura no estilo da famosa Edita Gruberova. Quando está no palco temos ali a magia do teatro personificado em forma de mulher. A difícil ária do punhal foi cantada magistralmente. Todos os fás superagudos foram girados e afinados em todas as vezes que foram emitidos levando o público ao delírio. Mais que isso, quero enfatizar a postura dramática e personificação da personagem que Carla consegue transmitir. Naquele momento, realmente ela é a Rainha da Noite. Não há dúvidas.
Elisa Machado foi uma Pamina correta. Começou tímida e foi crescendo à medida que o espetáculo foi se desenvolvendo. Cantou muito bem a ária "Ach, ich fühl's" destaque especial para seus pianíssimos.
Elisa Lopes, uma mulher de bela figura, esteve muito bem no dueto "Papagena! Papageno!" com Carlos Rodriguez mostrando ser uma excelente atriz e cantora.
Ricardo Barpp foi um Sarastro muito interessante. Linha de canto muito homogênea, excelente ator. A única crítica talvez seja um papel muito grave para sua voz, mas mesmo assim ele o fez muito bem com grande maestria e musicalidade.
O tenor Francisco Amaral foi uma revelação no papel de Monostatos. Estava impagável. Excelente ator cômico mostrou inteligência para o uso de uma voz pequena, mas muito bem projetada.
As três Damas se saíram muito bem. Destaque especial para a mezzo Rose Carvalho.
O Coral Porto Alegre fez uma intervenção satisfatória mostrando uma grande integração entre seus componentes, solistas e orquestra.
Eventuais problemas ocorrido durante a récita como não-sincronização da orquestra com solistas ou uma nota não bem emitida ou calante fazem parte do espetáculo ao vivo no meu sentir. A emoção de estar no teatro assistindo a um espetáculo ao vivo em plena era da globalização ainda se constitui em pura magia. Nada supera o feito na hora. O estar ali. O fazer parte, mesmo como ouvinte.
Não podemos comparar as produções de nossa cidade com as de vídeo do Metropolitan Opera House, Covent Garden eLa Scala.
Vivemos em um país onde não há cultura musical,
principalmente operística. Ao final do espetáculo ouvi o grito de BRAVO do
professor Decio Andriotti, veterano amante da lírica, que acompanhou muitas
produções do passado. Este BRAVO que até agora ressoa em minha memória me faz
acreditar que há ainda juízes em Berlim
e excelentes produções operísticas em Porto Alegre.
A ópera em dois atos de Mozart, libreto de Emanuel Schikaneder, a partir de várias fontes teve sua primeira apresentação em Viena em 30 de setembro de 1790. Portanto, é uma obra que combina muito com um teatro de câmara como é o São Pedro. Do ponto de vista hermenêutico a obra aborda a maçonaria, seus rituais, pois o próprio Mozart e Schikaneder eram maçons.
Tamino (tenor) decide salvar Pamina (soprano), filha da Rainha da Noite (soprano), das mãos de Sarastro (baixo) com a ajuda de uma flauta mágica. É acompanhado pela burlesca figura de Papageno (barítono), um caçador de pássaros. Tamino se convence de que Sarastro é de fato um alto sacerdote, dotado de benevolência e sabedoria, e, junto com Pamina, passa por testes antes de ser iniciado na sociedade de Sarastro. Enquanto isso, Papageno busca uma companheira, Papagena (soprano), que ele acaba conquistando. A Rainha da Noite e suas acompanhantes são vencidas pelo brilho do sol, e a ópera termina com um hino de louvor a Isis e Osíris.
A orquestra Unisinos Anchieta foi muito bem conduzida pelo regente Evandro Matté. Já na abertura foi possível perceber a precisão rítmica dos andamentos soando como se fossem relógios vienenses, mas com detalhes de matizes sonoros dando ênfase à dinâmica.
O cenário, apesar de simples, foi de extremo bom gosto, na linha das produções operísticas de vanguarda da atualidade. Um ator narrou a trama explicando ao público o que estava se passando no palco. A iluminação esteve muito bem, a cargo de Fernando Ochoa. Os figurinos de Anderson Souza seguiram a linha do cenário, destaques especiais para as roupas da Rainha da Noite, Papagena e Papageno e sua formidável alpargata verdade.
A última vez que assisti A Flauta Mágica foi no teatro do SESI, regente o excelente Cláudio Ribeiro , um dos maiores conhecedores do gênero lírico no Estado. Isso faz quase 15 anos. O Tamino, naquela ocasião, foi Juremir Vieira. Trata-se, portanto, de um cantor veterano nos palcos, com carreira internacional e vários prêmios
Carlos Rodriguez é um dos nossos maiores talentos. Podemos incluí-lo na categoria que o famoso tenor Lauri-Volpi, em seu livro Vozes Paralelas, intitula ator-cantor. Estar no palco para Carlos é como estar na sala de sua casa. Possui um carisma, uma empatia com o público, uma musicalidade e extremo bom gosto para cantar. Sua voz atingiu a maturidade e sua técnica se solidificou. Cantou muito bem todas as árias e conjuntos, mas como dito, o lado ator é seu ponto alto.
O grande destaque da noite foi o soprano Carla Domingues. Uma mulher com uma beleza exuberante que cantou as duas dificílimas árias das Rainha da Noite 'com um pé nas costas' como se diz no jargão popular. Carla é o que podemos chamar de um dramático de coloratura no estilo da famosa Edita Gruberova. Quando está no palco temos ali a magia do teatro personificado em forma de mulher. A difícil ária do punhal foi cantada magistralmente. Todos os fás superagudos foram girados e afinados em todas as vezes que foram emitidos levando o público ao delírio. Mais que isso, quero enfatizar a postura dramática e personificação da personagem que Carla consegue transmitir. Naquele momento, realmente ela é a Rainha da Noite. Não há dúvidas.
Elisa Machado foi uma Pamina correta. Começou tímida e foi crescendo à medida que o espetáculo foi se desenvolvendo. Cantou muito bem a ária "Ach, ich fühl's" destaque especial para seus pianíssimos.
Elisa Lopes, uma mulher de bela figura, esteve muito bem no dueto "Papagena! Papageno!" com Carlos Rodriguez mostrando ser uma excelente atriz e cantora.
Ricardo Barpp foi um Sarastro muito interessante. Linha de canto muito homogênea, excelente ator. A única crítica talvez seja um papel muito grave para sua voz, mas mesmo assim ele o fez muito bem com grande maestria e musicalidade.
O tenor Francisco Amaral foi uma revelação no papel de Monostatos. Estava impagável. Excelente ator cômico mostrou inteligência para o uso de uma voz pequena, mas muito bem projetada.
As três Damas se saíram muito bem. Destaque especial para a mezzo Rose Carvalho.
O Coral Porto Alegre fez uma intervenção satisfatória mostrando uma grande integração entre seus componentes, solistas e orquestra.
Eventuais problemas ocorrido durante a récita como não-sincronização da orquestra com solistas ou uma nota não bem emitida ou calante fazem parte do espetáculo ao vivo no meu sentir. A emoção de estar no teatro assistindo a um espetáculo ao vivo em plena era da globalização ainda se constitui em pura magia. Nada supera o feito na hora. O estar ali. O fazer parte, mesmo como ouvinte.
Não podemos comparar as produções de nossa cidade com as de vídeo do Metropolitan Opera House, Covent Garden e
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