IL GUARANI, PRIMEIRO DVD DE CARLOS GOMES. CRÍTICA DE ALI HASSAN AYACHE NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.

 
   Nós, amantes da música de Carlos Gomes sempre tivemos dificuldade em conseguir material em vídeo ou áudio de sua obra. A Funarte lançou anos atrás três óperas em VHS, Il Guarany, Fosca e Maria de Tudor. Em CD temos uma coleção com quase todas as óperas do compositor campineiro, gravações históricas realizadas no Teatro Municipal de São Paulo e no Teatro Municipal do Rio de Janeiro lançadas pela Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo. Existem ainda diversas gravações em vídeo e áudio piratas que circulam entre nós colecionadores. Agora chega em nossas mãos a primeira gravação original em DVD de uma ópera de Carlos Gomes.

    O DVD Il Guarany contém a gravação ao vivo da produção do Primeiro Festival Internacional de Ópera da Amazônia realizado em 2007 em Belém do Pará. Para comandar a orquestra chamaram um especialista, Roberto Duarte. Profundo conhecedor da partitura nos apresenta uma ópera revisada, cenas são acrescentadas e o balé ampliado. Com muitas regências de Il Guarany consegue tirar dos jovens da Orquestra Sinfônica do Teatro da Paz uma musicalidade correta, com tempos precisos. Sua leitura é simples, direta, sem riscos. 
 
Adriane Queiroz e Richard Bauer.
     
   A direção ficou a cargo de William Pereira, sua visão da obra nos remete aos tempos atuais, onde espectadores estão em um museu indígena e são convidados a se retirarem, pois acabou o horário de visitas. No apagar das luzes o guarda começa a tirar uma pestana e começa a apresentação. Delírios e sonhos de um guarda maluco. No demais a ópera volta ao Brasil colônia. Direção básica, conservadora, sem inovação, não acrescenta nada de novo, mas correta. Cantores quase sempre estáticos e pouca movimentação de massas corais. Il Guarany, como qualquer obra, tem infinitas possibilidades cênicas. O publico de Belém talvez não esteja preparado para as modernidades que existem no mercado. Na ópera é importante iniciar com o básico e depois ir introduzindo novas visões.
    Cenários quase inexistentes, uma mesa aqui e uma cama acolá são o máximo que o cenógrafo se permitiu ou lhe permitiram colocar no palco. No fundo a já tradicional pintura de floresta. Exibição de imagens da floresta amazônica em vários momentos soa como clichê. A luz é primordial em qualquer obra teatral, nela se suplanta a carência de cenários, mas o que vemos é o estático predominando. Cadê a criatividade! As cores são bonitas, mas só isso.
Adriane Queiroz como Cecília
     
   O balé do terceiro ato trás uma coreografia diferente, nunca antes me deparei com dança tão exótica, mistura balé clássico com dança de rua. As vezes interessante , as vezes de gosto duvidoso. Muitas produções nem chegam a apresentá-lo, fazem de conta que ele não existe. Ponto fraco da apresentação é o coral, o masculino tem sonoridade desequilibrada, baixos e barítonos suplantam e em muito os tenores. No decorrer dos anos e com a profissionalização do coral esse problema pode ser facilmente sanado.
    Os solistas e principalmente os comprimários são de bom nível. Já vi muitas óperas detonadas por péssimos cantores de papéis menores. O tenor Richard Bauer possuí belo timbre, agudos bem colocados suplantam suas deficiências cênicas. O soprano Adriane Queiroz tem bela voz, lírica como manda o personagem. Agudos brilhantes, vivos dão jovialidade a inocente Ceci. Boa presença de palco aliada a um belo rosto e uma voz interessante fazem com que tenhamos vontade de vê-la cantando a Ceci por estas terras.
Destaque para José Gallisa, baixo de voz potente, escura que controla bem os graves. No demais não posso deixar de citar as participações de Sávio Sperandio , Manuel Alvarez, Pepes do Valle , Jefferson Oliveira, Attala Ayan e Jefferson Luz. Todos com papéis menores mas muito corretos. Enobrecem a apresentação.
O primeiro dvd de Carlos Gomes nos apresenta extras de excelente qualidade, temos um making off com entrevistas do regente e solistas e muitas informações sobre balé, coral, orquestra e a realização do festival. Vemos isso apenas em dvds de ópera importados.
Carlos Gomes nasceu no país errado? Se o compositor campineiro tivesse nascido na América do Norte sua música seria tocada em todos os teatros líricos do mundo. Teríamos uma infinidade de dvds com inúmeras versões, os gringos valorizam o que é deles e com certeza, amariam ter um compositor de ópera desse nível. Mas como ele é brasileiro tivemos que esperar até o ano de 2008 para o lançamento de seu primeiro dvd.
Parabenizo o Governo do Estado do Pará pela realização do Festival Internacional de Ópera da Amazônia , entenderam que cultura trás dividendos. A Secretaria de Cultura do Pará e a direção do Teatro da Paz pelo lançamento do dvd. Fica a ressalva da distribuição. Quem não mora no Pará vai ter que se virar para conseguir o vídeo. Ele é vendido apenas na loja da Secretaria de Cultura. Este que vos escreve contou com a presteza e simpatia de Ana Auriel Lima da Costa que enviou um exemplar à São Paulo via correio.
   
Il GUARANY, Bauer, Queiroz, Gallisa, Sperandio, Valle, Oliveira, DUARTE. Teatro da Paz –Belém, Pará 2007. DVD –Formato NTSC-Região ALL- Cantado em italiano e com legendas em português-Inglês. Duração 3h 50 min -Extras-Making off, Festival 2007, Coral Marina Monarcha, Balé Ana Unger, OSTP. Audio Dolby Digital.
 
Ali.hassan Ayache 

Comentários

  1. Não entendo como uma direção "conservadora, sem inovação e que não acrescenta nada de novo" pode ser considerada, ao mesmo tempo, "correta". Para mim, isso é contraditório, paradoxal. Pois o desafio de toda direção é justamente lançar um olhar novo sobre a obra, revelar elementos nunca antes explorados, propor uma nova perspectiva. Sinceramente, não compreendo a noção de "correção" de certos críticos musicais. Ou, pensando bem, agora sim é que tudo fica mais claro....bom, a julgar pela descrição, parece que a montagem foi inspirada no filme "Uma noite no museu", com aquele chato do Ben Stiller...

    ResponderExcluir
  2. Existe uma Aida encenada em Berlin há uns 20 anos - que tb é dentro de um museu egipcio- os turistas saem- um cidadão fica escondido- e ele será o Radamés- quando as estatuas começam a se movimentar- No final ele fica preso dentro uma vitrine de vidro - junto com Aida - amanhece e o museu reabre- é genial

    ResponderExcluir
  3. critica desta Aida -de uma remontagem em 2007-=http://mostlyopera.blogspot.com.br/2007/12/aida-berlin-egyptian-museum-comes-alive.html

    ResponderExcluir
  4. Foi ótimo este DVD, bem ao contrário da apresentação do Guarani recente no Municipal de São Paulo que foi um assassinato de José de Alencar e Carlos Gomes.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas