PARIS É UMA FESTA ! MANON DE MASSENET. CRÍTICA DE ALI HASSAN AYACHE NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.



O que acontece quando um belo soprano canta ao lado de um grande tenor? Temos uma grande ópera, essa conclusão pode parecer óbvia, mas nem sempre excepcionais cantores juntos fazem grandes óperas. Tem que haver química, eles tem que estar à vontade para mostrar todo o potencial. Nessa versão da Manon de Massanet temos uma explosão de elementos, todos positivos, todos empolgantes, todos levam a um grande espetáculo.
    Anna Netrebko tem se destacado no cenário lírico pela beleza física, sua presença no palco contagia marmanjos e senhoras. Pela atuação dramática, grande atriz, sabe captar o sentimento do personagem e expressá-lo. Pela voz, de timbre belo, lírico, um pouco escuro, potente, bem projetado. A cantora russa tem todos os elementos de um grande soprano moderno, voz, atuação e beleza física.
   Está muito a vontade em Manon, peca no sotaque francês, mas isso passa despercebido quando ouvimos suas árias: Adieu,notre petite table ou Obéissons , quand leur voix appelle. De menina ingênua a caminho do convento para a consagração em Paris (Faz uma emergente inesquecível)  e a decadência na prisão. Tudo demonstrado com muita convicção através de uma atuação soberba. Isso é uma cantora moderna, isso é ópera do século XXI, uma união de elementos da arte. Isso renova e atrai publico.
   O tenor mexicano Rolando Villazón segue o mesmo padrão de qualidade, seu Le Chevaliers Des Grieux  evolui de jovem, ingênuo e cheio de amor para um homem maduro e amargurado. Sua voz tenta acompanhar a evolução do personagem, nas passagens líricas se sai muito bem, nas partes dramáticas falta peso. Atua bem ao lado da protagonista, incorpora o personagem, está a vontade no papel, melhor que na versão anterior com Natalie Dessay em Paris , 2007.
    Os comprimários de destaque são: Christof Fischesser faz Le Comte des Grieux , papel para baixo de voz encorpada. Ele é jovem demais, pouco lembra o pai do protagonista e sua voz está mais para barítono que para baixo. O Lescaut de Afredo Dasa é barítono de voz clara com boa musicalidade e atuação.
    Daniel Baremboin é um badalado pianista e maestro de renome mundial, rege orquestras pelos quatro cantos do mundo. Sempre achei ele melhor no piano. Na batuta da Staatskapelle Berlim seus tempos são excessivamente lentos, talvez seja para ajudar os cantores a interpretarem, senão haja fôlego! Mas isso torna a leitura da obra monótona, as vezes cansativa, árias que empolgam o publico são pouco ovacionadas. Perde a música, ganha o teatro.     
   A direção de Vincent Paterson capta a essência da obra de Massanet, não se acomoda, moderniza a leitura. Transporta a obra para a Paris dos anos 50, trem chegando com Manon, festas aos pés da Torre Eifel e a graça do Hotel Transilvania são elementos dinâmicos . Explora o potencial dramático dos cantores, movimenta-os sem exageros. A luz perfeita, ajuda e estimula, diretores dessa vez se entenderam, tiveram a mesma concepção. Figurinos condizentes com a época escolhida, impecáveis, perfeitos no acabamento, nos transportam a cidade luz da década de 50. Essa ópera inaugura um novo quesito, maquiagem, nunca vi trabalho tão bem executado. Coristas ou protagonistas estão impecavelmente maquiados, com o advento da alta definição a maquiagem deu um salto qualitativo.
    Comparando a primeira Manon que assisti com Edita Gruberova datada do ano de 1983 em Viena com a da Netrebko, existe uma evolução, como as gravações de ópera mudaram nesses 25 anos. A ópera é mais teatro que canto, do VHS estamos no DVD de alta definição, as produções são infinitamente mais caprichadas, lembram grandes peças de teatro ou produções da Brodway. Temos entrevistas com os protagonistas e diretores, escolha de capítulos e um encarte com artigo e resumo da ópera, tudo em inglês é claro.
    Vocalmente prefiro a Manon com a Gruberova ou com Beverly Sills em 1977 na New York City Opera. A Manon da Netrebko e do Villazon trás uma nova linguagem , moderna, atual, carismática. Na era da internet, da música digital, da velocidade, do consumo descartável, ópera parece uma aberração. Mas ela encontra um caminho, renova o público e como Fênix sempre renasce.

Ali Hassan Ayache

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