TARDE DE CONCERTO PARA VIOLINO E GRAVAÇÃO NA SALA SÃO PAULO. CRÍTICA DE VIVIANE CARNIZELO NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.
Sonnenberg, foto Internet
Guardando agradáveis surpresas, a temporada da OSESP de 2014 anunciava, para o sábado dia 09 de maio de 2014, pela série Imbuia, uma programação de gerar entusiasmo até em quem não é fanático: sob regência de Marin Alsop, a Abertura Leonora no3 de Beethoven, o Concerto para Violino, opus 14, de Samuel Barber com solo de Nadja Salerno-Sonnenberg e a Terceira Sinfonia de Prokofiev. A abertura de Beethoven foi apenas uma prévia do que seria a tarde.
Já inscrito no século XX, Samuel Barber resgata, em seu Concerto
para violino, a ênfase na expressão e na subjetividade emocional típicos do
Romantismo, mas também atrela a sua peça a liberdade de criação característica
de seu tempo. Amplamente executado, o concerto apresenta um claro contraste
entre os dois primeiros movimentos e o terceiro, o que se dá por dois
principais fatores: primeiro o próprio desejo do compositor de escrever um
movimento final de grande virtuosismo técnico, e segundo por conta do
encomendante da peça, Samuel Fels, pai do violinista prodígio IsoBriselli, que
exigiu uma passagem de alto grau de dificuldade – ironicamente recusada após a
conclusão de sua escrita, deixando a estreia nas mãos de outro violinista.
O concerto para violino de Barber é um convite a sonhar. Sonnenberg, violinista nacionalizada americana que, em 1992
lançou uma gravação da peça, sabia disso. No primeiro movimento, Allegro, ela
articulou nota a nota como um sussurro, frase a frase contando um segredo ao pé
do ouvido, envolvendo o público em uma atmosfera lírica capaz de levar os
pensamentos para longe e aflorar os sentidos que, já aceitando o convite, são
conduzidos por momentos de desespero e tristeza seguidos de um majestoso e
emocionante retorno ao tema que a OSESP construiu poeticamente, imergindo o
público no silêncio absoluto.
O segundo movimento, Andante, permeado por uma atmosfera
extremamente intimista e melancólica, permitiu que a solista e a orquestra se
expressassem com ainda mais intensidade emocional. Com a poesia escapando pelas
pontas dos dedos, Sonnenberg deixou a alma à mostra, finalizando o segundo
movimento com lágrimas nos olhos, em um momento de rara beleza em um palco,
quando a técnica e o alto grau de concentração se unem ao talento de se
desnudar emocionalmente de uma tal forma que as emoções escorrem sem fugir do
rigor exigido pelo instrumento.
O terceiro e último movimento, Presto, de inacreditável
virtuosismo, entregou ao público notas rápidas, límpidas, de agudos intensos e
cristalinos, acompanhados por uma orquestra igualmente empenhada com o
equilíbrio e a beleza da peça.Sonnenberg, em agradecimento aos aplausos,
executou, em conjunto com a OSESP, uma canção da ópera PorgyandBess, de George
Gershwin, intitulada Bess, youismywomannow, deixando o público pairar sob a
leveza musical de Gershwin.
A segunda parte do concerto ficou por conta da Terceira
Sinfonia de Prokofiev em uma execução importante para a orquestra: a gravação
para o selo Naxos.
Prokofiev, desde a infância, revelou grande interesse pela
ópera, compondo Velikan, em três atos
e seis cenas, quando tinha apenas 10 anos de idade. Já em sua fase madura, após
finalizar O amor das três laranjas,
Prokofiev se dedicou a OAnjo de Fogo,
com libreto baseado no romance simbolista de Valery Bryusov. Passando por
dificuldades para levar sua ópera ao palco, Prokofiev utilizou um trecho de
grandes passagens sinfônicas e temas complexos para compor sua Terceira
Sinfonia –O Anjo de Fogo só seria
encenado pela primeira vez após a morte do compositor. Do caráter intenso,
obscuro e muitas vezes demoníaco da ópera surgiu uma das características da
Terceira Sinfonia: o ostinato.
Melodia que se repete insistentemente durante uma obra, o
ostinato da Terceira Sinfonia trata da paixão de Renata pelo demônio Madiel.
Obsessiva, como toda paixão, ela permeia e aflora na mente da protagonista, na
sinfonia em forma de ostinato e no público com estranhamento ou até medo de seu
tom à beira do sinistro, cenário geral que a OSESP transmitiu com louvores.
Para quem duvida da intensidade da obra, a gravação logo será lançada pela
Naxos, responsável pelo registro do Ciclo Prokofiev de Sinfonias.
Vale, agora, ficar de olho na programação dos Clássicos da
TV Cultura. Pode ser que o concerto seja exibido, ao menos em parte, ainda
neste semestre.
Viviane Carnizelo
viviane.carnizelo@gmail.com palavrasdearte.wordpress.com
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