MAGDA OLIVERO NAO MORREU. ARTIGO DE HENRIQUE MARQUES PORTO NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.
Faz muito tempo, exatos 50 anos, mas parece que foi ainda outro dia. É que as coisas belas e boas se incorporam às nossas vidas e têm o poder de permanecer no presente.
Em 1964 o Theatro Municipal do Rio de Janeiro realizou sua última grande temporada lírica internacional. Abriu com o Mefistofele, de Arrigo Boito. Cesare Siepi, Flaviano Labò e Magda Olivero no elenco. Magda arrebatou o público na Cena da Prisão. Poucos dias depois subiu a cena aTosca, de Puccini. No elenco Magda Olivero e GianGiacomo Guelfi, além de Flaviano Labò e do grande Nicola Zacaria no pequeno papel de Angelotti.
Eu tinha apenas quatorze anos quando ouvi a voz de Magda vindo dos bastidores: “Mário, Mário, Mário!”. Apesar do ouvido adolescente, ainda em formação, imediatamente entendi que estava diante de uma grandíssima cantora e atriz. Eu já conhecia razoavelmente bem a ópera pelas gravações de Maria Callas, Renata Tebaldi e Zinka Milanov. Por toda a ópera não consegui despregar os olhos de Magda Olivero, então já uma senhora de 54 anos.
Eu não sabia então, mas jamais voltaria a ver o verismo e a teatralidade de Puccini tão bem interpretados. O segundo ato daquela Tosca foi particularmente inesquecível. Magda e Guelfi estiveram impressionantes! Foi mais do que uma apresentação. Foi uma aula.
Guelfi já se foi. Cesare Siepi também. Nas últimas semanas juntaram-se a eles Carlo Bergonzi e Licia Albanese. Magda morreu hoje, aos 104 anos. Morreu? Morreram? Não. Referências não morrem. Podem até ser esquecidas ou relevadas por algum tempo. Mas em algum momento hão de ressurgir na voz de algum cantor mais atento e inteligente.
A ópera estaria vivendo uma grande crise em nossos dias e existem, inclusive, aqueles que até sugerem um Requiem para ela. Acompanho com boa dose de reserva crítica esse debate. E me pergunto se não seria o canto lírico, e não o gênero ópera, que estaria em crise.
Magda Olivero foi uma cantora única. Formada nos fundamentos da escola de canto de Antonio Cotogni, cantava e atuava com uma arte e uma técnica próprias, o que a coloca entre as vozes isoladas. Ela escapa a qualquer tipo de comparação com outras cantoras. Até o mais radical entre os tolos -aquele que não ouve música, mas faz comparações- não consegue enquadrar Magda em seus esquemas primários.
La Olivero foi por muitas décadas a Diva real dos amantes de ópera de todo o mundo. Não cantava apenas no circuito restrito dos grandes teatros. Viajou o mundo todo e emocionou públicos em países e cidades que muitas estrelas –principalmente as atuais- sequer suspeitam que existem. Magda sempre tinha uns minutos, um sorriso e uma palavra simpática para o seu público. Joan Sutherland, em conversa com outra grande cantora, afirmou:
“-Nós somos apenas famosas, minha cara. A verdadeira diva da ópera é Magda Olivero.”
Arte não morre. Magda Olivero não morreu.
Henrique Marques Porto
Fonte: http://www.operasempre.com.br/
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