-FORA OSESP, FIQUE SALINHA, VOLTE A REVITALIZAÇÃO DA LUZ -SE MOSTRE INDEPENDENTE, CONCERTO! (20 ANOS JÁ É ADULTO, MEUS PARÁBENS !) ARTIGO DE JORGE HENRIQUE FERNANDES NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.
"Não havia no palco nenhuma estante de partitura com a inscrição OSESP. A única estante da OSESP na noite era a de CDs, selo Naxos, do amigo da Marin Alsop, mais à venda que à compra na loja de caixa sem filas. O hall era de uma heterogeneidade deliciosa, um Ibirapuera musical, e quase todos falavam despretensiosamente de música, notas de programa de distribuição gratuita nas mãos. Ali vi sim, o grande potencial para um Centro Cultural Júlio Prestes: a Sala São Paulo voltaria à cidade, mesmo que para isso a OSESP retornasse à Barra Funda, num auditório famoso – ou a Baltimore, o que duvido muito." (Jorge Henrique - Concerto da Orquestra Jovem do Estado de São Paulo, com Claudio Cruz e Antonio Meneses)
Frente (por enquanto):
a. ao talentoso, porém insuficientemente assistido, cenário da música de concerto séria no país;
b. à atual crise econômica brasileira que acomete inúmeros setores e, claro, o da cultura;
c. à política de facilitação do acesso às artes – consenso hoje quase mundial entre os mais distintos fomentadores e curadores, das mais diversas áreas;
Considero:
Não há mais espaço para os caprichos e as gastanças da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo que, junto com a sua regente titular, Marin Alsop, e seu diretor artístico, Arthur Nestrovski, canaliza para si os parcos recursos dessa área, sem a devida contrapartida para a sociedade ou para a orquestra.
Algumas argumentações (existem outras; chega):
Trata-se de uma fábrica de números, que facilmente alumbram o gestor mais ingênuo, mas que destina os seus recursos para solistas, regentes convidados, mordomias e gravações de repertório estrategicamente escolhido conforme as necessidades do selo para o qual grava desde a chegada da Marin Alsop, Naxos.
Apesar dos valores de seus ingressos equipararem-se ao de orquestras internacionais, mesmo com o câmbio desfavorável e quando essas vêm trazendo tudo até à Sala São Paulo (e ao Auditório do Ibirapuera, de fundos abertos com gente no gramado, coisa que a OSESP mais anuncia que faz), seus músicos residem no Brasil, recebem em reais e o seu orçamento é eminentemente público, contando também com inúmeros patrocinadores, o que justifica a pertinência de, sim, questionarmos – como cidadãos numa democracia, antes mesmo de apreciadores de música – os seus caprichos e gastanças.
O valor arrecadado com ingressos é irrisório quando comparado com as demais fontes que compõem seu orçamento, sendo assim, só se justificam para manter o verdadeiro e nojento esquema de castas, em que o público de um mesmo concerto, em dias diferentes, é totalmente diferente: não é uma orquestra democrática, é demagógica. Democracia é ter as diferentes classes distribuídas igualmente nos diferentes dias. E, acreditem, crianças maiores, jovens e adultos jovens têm sim a curiosidade de ver um concerto frequentado por adultos, no horário, dia e repertório que o pouco acessível ingresso reserva a eles.
Ver um concerto é passear no hall, ver a arquitetura da Sala São Paulo pelo lado de dentro, conhecer pessoas e conversar sobre o repertório – e não apenas preencher às pressas as cadeiras vazias da plateia já no terceiro sinal, benefício dado aos universitários, mas cuja beneficiada mesmo é a OSESP, promotora do concerto, para não ter o constrangimento da plateia vazia frente aos caros regentes e solistas internacionais convidados, isso sem mencionar que concerto com plateia vazia ou fica feio na foto, ou dá muito trabalho ao fotógrafo, isso se não prejudicar a acústica, do ensaio geral inclusive. Universitário gosta sim de escolher lugar – e também sabe ler essas coisas. Se for de música, ele pode contribuir muito para as atualmente fúteis e por vezes nauseantes conversas do hall – não eram assim; se se expressar melhor com a caneta que com o instrumento musical, seja a do traço ou a da letra, pode fazer uma bela comparação dessa com a prática antiga de se entrar em um espetáculo sob a lona do circo, com a devida anuência de seus funcionários e indicadores. No prelo.
Ainda sobre os solistas internacionais acima mencionados, que não têm culpa das escolhas da OSESP e muito menos da clave em que a direção artística os coloca, muitas vezes descoberta quando chegam aqui, é curioso notar que, apesar de abençoarem, mesmo sem querer, com o ar de sua muito bem paga graça internacional, o público, a própria orquestra, a Sala São Paulo, a cidade, o Brasil e as lentes das câmeras internacionais, não raramente o que deixam em solo brasileiro é um solo difícil de violino para um mero mortal músico celetista da orquestra executar. Esse, sinto muito, é inevitável: será aplaudido pelos bateres de pés no chão e arcos no ar, fenômeno muito significante e que, se parar de existir, pensarei, por mim e por muitos desses convidados, em mais represálias aos celetistas contratados, não raramente mulheres e imigrantes – como se as atualmente sofridas não fossem o suficiente.
Voltando à gestão da coisa pública – sim, a Fundação OSESP é uma OS, como as diversas outras, dos mais diversos setores (nesse caso uma Organização Social da Cultura, que mantém contrato de gestão com a Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo para a manutenção e desenvolvimento da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo) – é pertinente lembrarmos da coisa pública e se fazer algumas considerações: a população que não pode arcar com o abusivo e atualmente injustificável valor dos ingressos também gostaria não apenas de assistir a um concerto, mas de também participar do ritual concerto, o concerto em sua totalidade. Sim, menos abastados também gostariam de ser plateia ‘tutti’, por que não? Muita ousadia? E o ritual concerto começa é dias ou semanas antes, na escolha dos lugares – experiência, aliás, indescritível e muito prazerosa, principalmente quando estamos conhecendo uma sala ou o repertório. Ensaio aberto apenas não serve. Concerto gratuito a-funcionária-da-bilheteria-escolhe-o-lugar-e-não-reclame menos ainda: não é esmola – é fruto de impostos públicos e de doação de pessoas sérias, físicas e jurídicas, que querem ter seus nomes associados a benfeitorias à cidade e a seus cidadãos. É muita pretensão achar que o que atrai a plateia a um concerto é só ouvir a orquestra tocar, se limitando a perceber a mudança de tonalidade ou o tipo de tratamento dado a um tema ou material melódico. Assim, sinto muito: vai precisar de muito solista do estrangeiro com muito trema e consoante no nome para formar plateia. Plateia se forma, dentre outras coisas – muitas das quais por aqui não se faz questão de oferecer – é com sensação de pertinência ao espaço. Se não for assim, uma chuva ou um dia frio e nem para música de câmara se consegue público – haja universitários! Por fim, para por fim, se for só para ouvir a música, que se extinga então a orquestra (e o recém modificado slogan já trocou a termo orquestra por OSESP) e a confinem de vez a um estúdio com meia dúzia de pessoas ensaiadas e aplausos gravados e editados, como faz a televisão. Tomemos apenas cuidado com todo esse entusiasmo com a possibilidade de uma assinatura mundial de 'streaming' e com gravação de CDs, pois, tão cedo o ouvinte se inicia nesse repertório, ele descobre – e por conta própria – rádios e canais analógicos e digitais de repertório e, por que não, qualidade de músicos, de gravação, de captação e de transmissão muito melhores que os da marca OSESP, não raramente de disponibilização gratuita, uma vez que quase todas as peças são de domínio público. Lá também ele encontra o período Barroco, inclusive com peças de Bach, pois é um ambiente isento dos interesses de Klaus Heymann, dono do selo Naxos e amigo da Marin Alsop, em regravar o repertório para a música sinfônica para o seu selo até há poucos anos decadente – quase tanto quanto a situação do Gramophone, outra história.
Por fim, por tudo isso, desejo, por enquanto:
1. Uma boa rescisão de contrato à Marin Alsop – a maioria dos músicos não gosta de você e a plateia já sabe disso. Acredite: ninguém gosta de ir a um concerto com clima pesado – se não sai na gravação ou transmissão, sai na música – e não é terminando a peça de depois do intervalo com um 'tutti fortíssimo' que vocês irão convencer. 'Tutti fortíssimo' pode até retirar sensibilidade no momento, mas não apaga a memória.
2. Que volte, sei lá, no mínimo ao jornalismo e às aulas na PUC, o jornalista Arthur Swarovski – como é conhecido no meio Salinhoso, esse sim verdadeiramente internacional, das redes sociais Inbox de Google Translator. Nada como a criatividade de solistas internacionais, músicos independentes (muitas vezes me questiono o que vem primeiro).
3. Que todos os músicos e jornalistas que se simpatizam com a Marin, que tentem uma audição em Baltimore ou uma coluna no 'The Guardian' – quanto ao primeiro ignoro, mas, quanto ao segundo, posso oferecer contatos.
4. Que a OSESP cesse o vexatório desperdício do dinheiro que não gera, nem mesmo com os CDs do Heymann-Alsop, mas que os direciona, através dos recursos humanos da orquestra e à revelia da paciência da cidade, justamente para a gravação desses mesmos CDs – e, quiçá, para a consolidação de um canal 'streaming' que, depois de abusar da boa vontade dos brasileiros em dar um retorno de como está a transmissão, tenho dúvidas se seu acesso continuará gratuito depois que a técnica estiver melhor lapidada. Técnica lapidada, a Sala São Paulo vira de vez um estúdio – idêntico aos de televisão, só que com recursos públicos e com fachada de arte – e terminamos de uma vez por esquecer o já engavetado projeto de revitalização da Luz e de solução dos problemas sociais e de saúde pública da região. Se o preço da Pinacoteca foi o espaço na revista da OSESP, foi bem barato. O Museu da Língua Portuguesa, bem, melhor nem comentar.
5. Que a OSESP cesse o desserviço que faz aos cidadãos (e aos artistas da Pinacoteca, inclusive) ao publicar uma revista na qual, em não poucas vezes, ao invés de explicar complexidades do repertório de forma simples – função de toda nota de programa que se preze (e que, por fazer parte do concerto, deveria ser gratuita) –, pratica a retórica da complicação do discurso, recurso de dominação política mais que bem descrito, documentado e condenado: só faz desconstruir plateia ou aprofundar o nauseante fosso pseudo-intelectual, porém social, que separa os concertos dos 'muito pagantes/idosos/somosentendidos/nosgravemnastransmissões' dos 'pouco pagantes/jovens/sãoleigos/nosmencionemnasbenfeitorias'.
6. Que a OSESP pare de incorporar valores equivocados à música de concerto, ao espaço público e às artes como um todo, denigrindo o nome daqueles que a apoiam.
7. Ninguém aqui tem direito, hoje, inclusive músicos e jornalistas (muitos dos quais se dizem críticos), de falar politicamente de músicos como, por exemplo, o André Rieu – o circo é dele, vem e vai embora. A OSESP faz pior – e continua sugando.
Jorge Henrique Fernandes
Fonte: https://www.facebook.com/jorgehenrique.fernandes.31?fref=ufi
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