PROGRESSO, CORRUPÇÃO E FALTA DE ÉTICA : A MÚSICA CLÁSSICA BRASILEIRA EM 2015. ARTIGO DE OSVALDO COLARUSSO NO BOG DE ÓPERA E BALLET.
As duas melhores novidades na música classica brasileira em 2015: temos o renascer da programação musical no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, que agora é dirigido de forma bem acertada pelo compositor João Guilherme Ripper, e a do Palácio das Artes de Belo Horizonte, cujo novo diretor artístico é o maestro Silvio Viegas. Valorização do artista brasileiro, títulos interessantes, programação de qualidade. Mas é doloroso perceber que a musica clássica brasileira acabou aparecendo em notícias não de cultura, mas sim em páginas policiais. Fatos simplesmente vergonhosos que demonstram que a corrupção no país atinge também órgãos ligados à cultura e à música clássica. Longe de qualquer ideal artístico vemos agendas que deveriam ser públicas se transformarem em agendas pessoais que associam corrupção e uma absoluta falta de ética. Não falamos de falta de verbas. Pelas denúncias de corrupção percebemos que em nome da música sinfônica e de ópera somas enormes de dinheiro público pensado originalmente para promover eventos artísticos acabaram sendo desviados.
Theatro Municipal de São Paulo
Desde que, em 2013, começou a atual gestão administrativa e artística do Theatro Municipal de São Paulo os escândalos e a total falta de ética tem se tornado uma rotina por ali. No início foi uma planejada extinção do Coral Paulistano, as demissões intempestivas de artistas de altíssima competência como foi o caso do maestro Mario Zaccaro , que era há décadas maestro do Coral Lírico, e do maestro Jamil Maluf, que regia a Orquestra Experimental de repertório desde sua fundação, e uma série de atitudes que podem se classificar como desastrosas para a ética de uma entidade que produz cultura. Exemplo flagrante disso foi a demissão e afastamento de diversos instrumentistas e coralistas. O caso mais extremo foi da coralista Margarete Lorureiro, deficiente física, que conseguiu a duras penas ser readmitida por ordem da justiça. Citando o blog do diretor teatral Cleber Papa “… há três anos um sombrio desprazer nos envolve quando se fala do Theatro Municipal de São Paulo”. Para culminar, há algumas semanas, estourou um escandaloso caso de corrupção no seio da administração do teatro. José Luiz Herencia, diretor geral da Fundação Theatro Municipal de São Paulo até 19 de novembro passou a ser investigado pelo Ministério Público. Ele é suspeito de participação em um esquema de desvio de verbas públicas e recebimento de propina na Prefeitura de São Paulo, que estima em cerca de R$ 20 milhões os prejuízos aos cofres públicos. Logicamente, o que mais se ouviu na Praça Ramos de Azevedo (onde fica o teatro) de outros funcionários graduados foi a velha frase “eu não sabia de nada”. Há dinheiro sim para a Cultura. Basta ver o montante desviado. Num país sério isso traria sérias consequências. Por aqui apenas o Sr. Herencia saiu, aliás, por pedido dele próprio. O resto, como se diz, fica como antes no quartel do Abrantes.
Orquestra Sinfônica Brasileira
Muitas pessoas acreditam que a Orquestra Sinfônica Brasileira é uma entidade privada, particular. É em termos. A Fundação Orquestra Sinfônica Brasileira se mantém principalmente de dinheiro público. Entidades como o BNDES e o MINC financiam as atividades da entidade. Desde agosto deste ano o Ministério Público Federal orienta órgãos federais a não repassarem fundos para a entidade e agora, no final do ano, a orquestra passou efetivamente a ser investigada pelo Ministério Público. O que se percebeu a princípio é que certos diretores enriqueceram com dinheiro público colocando em pequenas letras de seus contratos porcentagens questionáveis sobre a pretensa “lucratividade” de uma entidade que deveria ser sem fins lucrativos. O que é mais triste é que existe o risco de não haver dinheiro para pagar os salários dos músicos. É a tal história da corda que sempre arrebenta do lado mais fraco. Vale a pena lembrar que a direção da Fundação Orquestra Sinfônica Brasileira foi a responsável por uma destrambelhada ação em 2011 quando dezenas de músicos foram ameaçados de demissão. As façanhas administrativas levaram a Fundação a formar uma orquestra de dissidentes (OSB Repertório e ópera), que fez tamanho sucesso que incomodou muita gente. Ao ver que não teriam caixa para manter esta segunda orquestra, propôs que os músicos voltassem à OSB, e que poderiam não tocar quando o Diretor Musical (que foi o responsável da ideia das demissões) regesse. Confesso que a princípio não acreditei. Já imaginaram algum músico da Filarmônica de Berlim sendo desobrigado a tocar quando Simon Rattle regesse? Pois no Rio de Janeiro isso acontece.
Coro da OSESP: Naomi Munakata demitida
Por duas décadas o excelente Coro da OSESP foi regido pela maestrina Naomi Munakata. Ela, que foi minha colega em diversos cursos, é uma musicista de altíssimo nível. Discípula de Eric Ericson (grande maestro sueco. Foi ele quem regeu A Flauta Mágica filmada por I. Bergman) é sem dúvida a mais bem equipada maestrina de coro do país. Foi demitida de forma sumária pela direção da OSESP (Arthur Nestrovski, Marin Alsop e Marcelo Lopes) que num comunicado oficial teceram muitos elogios à maestrina, mas afirmaram em mais de uma oportunidade que o coro não estava atingindo o nível esperado. É público e notório que Naomi não se dava bem com um dos diretores da OSESP, mas demiti-la desta maneira é algo impensável em uma organização que pretende ser séria. Enquanto em outros lugares do mundo a mudança de um maestro é anunciada anos antes, e seu sucessor é anunciado anos antes de assumir, aqui no Brasil não há uma sucessão de maestros que não se aproxime daquilo que se chama de “puxação de tapete”. Não há lisura, não há ética. Isso é o que acontece em todas as orquestras “tupiniquins”. Naomi, infelizmente, tornou-se vítima deste tipo de ação. No sistema “bate e assopra” a OSESP a tornou “Maestrina honorária”.
Alto nível técnico. Baixo nível ético
Não há dúvida de que o nível técnico de nossas orquestras sinfônicas, corais e teatros de ópera subiu muito nos últimos anos. E a quantidade de orquestras aumentou consideravelmente, o que é muito bom para o país. Infelizmente esta melhora não se dá na qualidade humana nas organizações musicais. Egos, injustiças e ambição desmedida financiada com dinheiro público alimentam um dilema básico entre o nível técnico e o nível humano. A melhora deste último é o que espero sinceramente para o ano que vem e para os próximos também. Acredito que sem qualidade humana a atividade artística não faz sentido.
Osvaldo Colarusso
Fonte: https://www.facebook.com/groups/230928187036126/
É Osvaldo, é triste mas não é novidade ... eu, particularmente, tenho visto isso há 36 anos ... e la nave va .... abraço.
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