O LAGO DOS CISNES: A SIMBOLOGIA DE UM CLÁSSICO. CRÍTICA DE WAGNER CORREA DE ARAÚJO NO BLOG DE ÓPERA E BALLET.



Há mais de um século, desde o sucesso da versão de 1895, pós a fracassada estreia russa  em 1877, O Lago dos Cisnes se tornou um protótipo do balé romântico e da dança clássica.

Neste sentido ,a composição de Tchaikovsky ficou marcada por seu fator simbológico não apenas no plano musical( com a utilização do leitmotiv ) e coreográfico( o rigor da técnica acadêmica a serviço do potencial sinfônico). 

Estendendo seus significados aos questionamentos psico/filosóficos da duplicidade personal, contextualizada no  romance O Duplo(1846) , de Dostoievsky, inclusive inspirando ,em anos recentes,a trama dramatúrgica do filme Cisne Negro.

No balé,  o desdobramento sensorial do  personagem   Odete/Odile, em seu processo de encantamento,  vai de um idílico  romantizar a um exponencial sensualizar, na personificação da brancura ou do negrume de um cisne.

E é esta transmutação do eu no outro que permitiu a mutabilidade de suas identificações, da madrasta inicial ao feiticeiro Von Rothbart, como na passagem do feminino ao masculino, nos cisnes da polemizada versão de Matthew Bournes. Ou no complexo edipiano do Principe Siegfried pela Rainha Mãe, segundo a transcrição de Mats Ek’s .

Também a sua  trajetória cênica brasileira é significativa e singularizada pela pioneira versão integral nas Américas, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, há mais de meio século (1959),através da montagem de Eugenia Feodorova.

Nesta temporada, O Lago dos Cisnes na retomada da concepção de Yelena Pankov (2006),é um mote especial para o  Ballet do TMRJ comemorar , com digno acerto de repertório clássico, os seus oitenta anos de criação.

Desde o prólogo, fica instaurada a magia da representação, tanto pela segurança do Corpo de Baile, como  pela energia, consistência e desenvoltura dos solistas.

Se faltou, mesmo com sua elegante gestualidade, uma maior entrega passional ao personagem de Siegfried (Filipe Moreira), coube às atuações de Claudia Mota e de Cícero Gomes a grande interatividade com o público.

Com uma ressonância de brilho privilegiado, tanto no plano técnico como emocional, na performance de Claudia Mota, em sua imposição equilibrada do arquétipo dialogal Odete/Odile. Como no exponencial domínio corporal e no rendimento cênico do Bobo da Corte, de Cícero Gomes.

O  senso plástico da cenografia e figurinos, paralelo à sintonia estética do processo coreográfico de Yelena Pankova, a partir da criação original (Petipa/Ivanov) com sutis variações,teve seu acertado contraponto na sustentação harmônica da OSTM, conduzida com mãos firmes pelo maestro Javier Logioia Orbe.

Ainda com sua insistente constância , entre idas e voltas, no repertório do Ballet do TM, graças ao empenho de seu comando/diretor ( Ana Botafogo/Cecília Kerche) não se perdeu, em momento algum, a espontaneidade criativa de mais uma nova remontagem.  

Consubstanciada, afinal, na sua nobre missão de manter  vivo o transe histórico em torno de  uma obra clássica de carismático dimensionamento  artístico/espiritual.


O LAGO DOS CISNES, com o Ballet e a OSTM, está em cartaz no Theatro Municipal/RJ,Cinelândia, dias 14,15, 17 e 18 de junho ,às 20 hs. 180 minutos. 

Wagner Correa de Araújo

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