JOAN SUTHERLAND - A ESTRELA DE ETERNO BRILHO. ARTIGO DE MARCUS GÓES NO BLOG DE ÓPERA & BALLET.




O soprano Joan Sutherland (1926/2010) faleceu na Suíça neste dia 10 de outubro passado. São, de tal modo importantes para a música, a arte e a carreira dessa monumental criadora de beleza, que nunca será demais falar nela, pensar nela, escrever sobre ela.

Vi-a uma vez só, em “NORMA” em 1969 no Teatro Colón de Buenos Aires, e tamanho foi o impacto da atuação da extraordinária artista que dali em diante fiquei sempre esperando ou que ela viesse cantar no Brasil ou que eu pudesse vê-la outra vez em algum teatro.

Infelizmente, nada disso aconteceu e restringi-me a colecionar gravações em LPs, audio-cassettes, fitas de rolo, vídeos e DVDs em que pudesse ao menos ouvi-la ou vê-la em gravações.

Mas lembro-me muito bem. Era ela um soprano de voz volumosa mas aveludada e redonda, sem farpas ou arestas, muito ágil, de grande capacidade de ornamentos e superagudos. De modo muito pessoal, dava declarada preferência à beleza do timbre e da sonoridade no lugar da clareza da pronúncia, cobrindoos sons em vez de deixá-los abertos e agressivos. Com ela, era raro um “a” aberto como em outras cantoras famosas de sua geração.

No repertório em que mais atuava, em obras de Händel, Bellini e Donizetti, esse sacrifício eventual da clareza da pronúncia em prol da beleza e elegância da sonoridade conduzia a um prazer poucas vezes trazido ao público no século XX, como afirmam estudiosos e especialistas conhecedores que a viram cantar.

Os críticos internacionais assim a definiam: ”Her voice is a dramatic coloratura of great volume, beauty of tone and agility". (Charles Osborne).

“...elle apporte un soin extrême à retrouver l"esprit du bel canto grâce à sa phénoménale précision dans l"agilité, son goût de l"ornementation et des nuances". (Rosenthal et Warrack).

A crítica italiana, tão severa ao julgar cantores de outros países, vai ao ápice dos elogios ao dizer: “ voce estesissima, penetrante e limpida, si è imposta in primo luogo per la capacitá di eseguire il repertorio di agilitá, con il timbro e il volume di un soprano lirico, sfoggiando un virtuosismo trascendentale e probabilmente inedito per il nostro secolo". (Enciclopedia Garzanti della Musica).

A pureza extrema de seu timbre a conduziu a ser julgada em sua época a maior representante do verdadeiro bel canto italiano, tema tão mal compreendido e entendido pela grande maioria do público, que via muitas vezes em outras cantoras ágeis e de voz extensa coriféias daquele bel canto, mesmo sendo a voz e o timbre dessas cantoras, com suas arestas, seu vibrato e seu “vinagre”, como dizia Toscanini, o oposto do que define um soprano representante do legítimo bel canto italiano.

Essa pureza de timbre e suas características bel cantistas a tornaram uma intérprete não tão extraordinária de Verdi, quando lhe apontavam carência de incisividade no fraseado e “slancio” dramático. Também em Puccini a julgaram menos efetiva. Todas essas restrições, cabíveis por sinal, muitas delas feitas por críticos e musicólogos de primeira linha, não deslustram nem diminuem em nada o valor dessa extraordinária cantora, a quem foram dirigidos os maiores elogios feitos a uma artista de seu gênero no século XX.

Apagou-se a lâmpada de seu quarto de dormir; não se apagou e nunca se apagará, o ofuscante brilho eterno que circundou e circunda a gloriosa cantora que foi JOAN SUTHERLAND, estrela entre as estrelas, diva entre as divas, uma das filhas mais queridas da Música e da Beleza.

IL DOLCE SUONO / MI COLPÍ DI SUA VOCE
MARCUS GÓES – 10 DE OUTUBRO DE 2010

Autor Marcus Góes (1939-2016)

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