"LO SCHIAVO" E O INDIANISMO ROMÂNTICO DE CARLOS GOMES NO MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO. CRÍTICA DE MARCO ANTÔNIO SETA NO BLOG DE ÓPERA & BALLET.



 O fato de trazer de volta ao palco do Theatro Municipal do Rio de Janeiro a ópera indianista "Lo Schiavo" do compositor campineiro Antonio Carlos Gomes  (1836-1896) é uma vitória numa produção inédita que prima pela assinatura de Pier Francesco Maestrini na direção cênica.
Com libreto de Rodolfo Parravicini, a ação de Lo Schiavo, desenrola-se no longínquo ano de 1567, quando Estácio de Sá expulsou os franceses da Guanabara, no período da Confederação dos Tamoios, a obra mantém a visão romântica do indianismo literário, numa limitação histórica, que faz do índio e não do negro a raça escravizada.
        Estreada no Teatro Lírico do Rio de Janeiro a 27 de setembro de 1889, tomado por enredo um assunto abolicionista criado pelo Visconde de Taunay, cuja intenção se enquadrava no espírito dominante da época e que não era outro senão um exaltado movimento pela redenção da escravatura, Carlos Gomes revestiu a sua obra de um sentido profundamente nacionalista, sobretudo no respeito à originalidade rítmica dos bailados no 2º ato, cujos temas se desenvolvem sob uma perfeita ambientação indígena, para os quais Gomes mandou construir instrumentos característicos "indígenas", ou ainda, da célebre "Alvorada", na qual não foi somente músico de rara inspiração, mas poeta na verdadeira acepção do termo. É a aurora brasileira que desnuda nos olhos e aos ouvidos do público; é o nascer do dia brasileiro, que Gomes descreveu em páginas de beleza penetrante e grandiosa, pairando em suas melodias sentimentais e em seus acordes misteriosos o farfalhar da folhagem, os voos dos pássaros e seus cantos característicos, o crescendo luminoso do sol e seus reflexos multicores na relva, nas copadas árvores e nas águas límpidas do Paraíba, enquanto o trompete ao longe lembra a frota lusitana e um hino final culmina o quadro sonoro, com a marcha guerreira dos tamoios. A orquestra do Theatro Municipal, muito bem. particularmente na Alvorada, cuja execução mereceu o prêmio da maior ovação da noite. Regeu-a o maestro Roberto Duarte. Esta produção utiliza a edição FUNARTE, revista e editada por Roberto Duarte. 
         Após o Prelúdio (Andante Pastorale) que se inicia com longa frase no 1º oboé, em solo expressivo na noite de sexta-feira de 21 de outubro, surge Leonardo Páscoa como Gianfera, o feitor do Conde, um barítono de voz generosa e muito bem timbrada. O baixo Saulo Javan (Conde Rodrigo) ofereceu lanço regular em suas partes, vocal e cênico, especialmente no duetino com o filho no ato I.
         O soprano Adriane Queiróz, natural do Pará, possui uma voz colorida, iniciou um tanto morna em sua índia Ilara na ária "Ei partirá lasciandomi nel cuore".Imprimindo belos gritos de paixão e com expressão ajustada, interpretou a ária "Ciel di Parahyba" (ato III) com a simplicidade da modinha; bem como o dueto subsequente com Iberê e na bela romança "Come serenamente" do ato IV. 
         Fernando Portari, no papel de Americo, é um tenor lírico de notável desenvoltura cênica e estampou os seus atuais recursos vocais  à tessitura do papel. Cantou "Quando nascesti tu" com grande maleabilidade vocal e muito refinamento estilístico-musical. É um artista completo nos duetos com Ilara e Iberê. 
          Nova personagem, a Condessa de Boissy, residente em Niterói, papel escrito para soprano coloratura, intervém no segundo ato, com páginas de virtuosidade brilhante. O belo e difícil personagem em sua escrita musical não foi preenchido por Cláudia Azevedo. Prejudicada pelos andamentos ralentados do regente, agravaram-se ainda mais as suas dificuldades técnicas de coloratura para vencer um papel acima de suas possibilidades. 
           O Iberê do barítono Rodolfo Giugliani cresceu ao longo do espetáculo. Prejudicado também pelos andamentos arrastados do maestro, precisou conter a pulsação em seu canto de guerra (ato III) ; demonstrando voz ampla e maleável, expressiva em sua ária  "Sogni d'amore" no ato IV. E saiu-se bem num papel que põe cruelmente à prova o seu registro grave, sobretudo na cena de confrontação com os seguidores do cacique Goitacá, vivido por Pedro Olivero (baixo). Atuaram neste segmento Ricardo Tuttmann (Guaruco); Ciro D'Araujo (Tupinambá); Pedro Gattuso(Tapacoá); Geilson dos Santos (Carijó); Weber Duarte (Caiapó); Celso Mariano (Arary); Elizeu Batista (Botocudo) mais Luiz Furiati, Ilem Vargas, Fabio Belizallo e Luiz Gustavo Farina, muito bem,  como elenco de apoio. 
             Bonita a interpretação dos bailarinos (Corpo de Baile do TM) nos típicos bailados no ato II; nas adequadas e características intervenções cênicas culminadas pela primeira bailarina Karen Mesquita. O Coro do Theatro Municipal muito bem preparado por Jesus Figueiredo, obteve êxito em sua participação. A iluminação de Fábio Retti chegou tardiamente em diversas cenas no decorrer da ópera. 
              No contexto geral a montagem de "Lo Schiavo" faz justiça ao nosso imenso compositor Carlos Gomes, é visivelmente efetiva com belos e apropriados cenários de Juan Guillermo Nova, bonitos figurinos de Alberto Spiazzi e a eficiente e competente direção cênica de Pier Francesco Maestrini, que soube aproveitar os melhores recursos e qualidades de cada artista participante do presente espetáculo que se repete nos dias 23, 25 e 27 de outubro. Esperamos que São Paulo, também  possa apreciá-la em seu Theatro Municipal, em 2017, conforme intercâmbio cultural promovido pelo Ministério da Cultura. 

Escrito por Marco Antônio Seta, em 22 de outubro de 2016.
Jornalista Inscrito sob nº 61.909 - MTB/SP

Cena de Lo Schiavo, foto Internet

Comentários

  1. Bravi tutti!!! Viva Carlos Gomes, o maior compositor operistico das Americas e um dos melhores do mundo!!!

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  2. Bravi tutti!!! Viva Carlos Gomes, o maior compositor operistico das Americas e um dos melhores do mundo!!!

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