A "CURA GAY", CERTAMENTE DISPENSADA POR DOIS GRANDES COMPOSITORES. ARTIGO DE OSVALDO COLARUSSO NO BLOG DE ÓPERA & BALLET.
Se muitos compositores foram atormentados pela sua (homo) sexualidade, como Tchaikovsky e Szymanovsky, ou que a sublimavam e a camuflavam como Manuel de Falla e Ravel, duas histórias de romance entre homens músicos foram duradouras e deixaram um legado artístico excepcional. Num momento em que se volta à questão de tratar a homossexualidade como doença é um bálsamo sabermos e lembrarmos de dois compositores gays que nunca teriam tido necessidade de se sentar num divã de um analista buscando uma suposta “cura”, pois foram absolutamente tranquilos com suas vidas afetivas. Para aqueles que pensam que relações gays são sinônimo de tragédia, duas histórias sem tragédias.
Peter Pears e Benjamin Britten
O mais importante compositor inglês do século XX. Benjamin Britten (1913-1976) conheceu o tenor Peter Pears (1910-1986) em 1937. Por 39 anos sua estreita convivência e seu relacionamento amoroso resultou em dezenas de óperas compostas por Britten tendo em mente a voz de seu companheiro (inclusive Peter Grimes, Billy Bud, e Curlew River), e o mesmo se deu em diversas obras pensadas para voz de tenor e orquestra (Serenata para tenor, trompa e cordas e Nocturne para tenor, sete instrumentos solo e cordas). O amor e companheirismo dos dois foi admirado e respeitado simplesmente pela maneira tranquila como assumiram sua relação, mesmo num período em que as leis inglesas criminalizavam as relações entre pessoas do mesmo sexo. A Rainha Elizabeth e seu esposo, o Príncipe Philip, sempre foram amigos dos dois, e quando da coroação da monarca em 1953 o convite foi feito aos dois da mesma forma como para todos os outros casais.
Pierre Bernac e Francis Poulenc
Ao contrário de Britten, que teve somente um companheiro na sua vida, Francis Poulenc (1899-1963), um dos mais importantes compositores franceses do século XX, teve diversos companheiros, normalmente relacionamentos apaixonados e que nunca foram segredo para ninguém. O primeiro deles foi com o pintor Richard Chanlaire (1896 – 1973). Seu próximo companheiro foi o escritor Raymonde Linossier (1897-1930) morreu de forma trágica quando viviam um feliz romance. Apesar de Poulenc ter tido diversos relacionamentos (inclusive com seu motorista particular, Raymond Destouches, a quem dedicou algumas de suas obras mais importantes) sua paixão pelo barítono Pierre Bernac (1899-1979) resultará em uma realização musical excepcional. Acredita-se inclusive que a relação dos dois, que de comum acordo transformou-se numa íntima amizade, foi sublimada em incontáveis obras primas vocais. Excursionaram pelo mundo todo em recitais de canto e piano. Poulenc, que a partir de 1930, nunca escondeu sua preferência por homens, viveu intensamente seus relacionamentos. Longe de colocar nele a pecha de infeliz.
Osvaldo Colarusso
Fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/blogs/falando-de-musica/cura-gay-certamente-dispensada-por-dois-grandes-compositores/
ResponderExcluirCertamente os senhores Britten e Poulenc foram pessoas de sorte,pois nos tempos em que viveram até muitos luminares das artes e ciências ainda eram totalmente excluídos da sociedade devido ao pudor das pessoas da época.Pior,muitas vezes indivíduos fora dos padrões morais eram submetidos a tratamentos como lobotomias,terapias hormonais,eletrochoques,castrações químicas etc com os efeitos colaterais mais nefastos possíveis para os infelizes que caíam nas mãos dos "especialistas" daqueles tempos.Gosto muito de ler biografias de grandes personalidades,são a meu ver um modo incrível de se conseguir uma boa formação,mas também podem nos revelar todo o lado polêmico e controvertido das personalidades das pessoas a quem admiramos,afinal ninguém é santo.Com relação ao senhor Poulenc,um catolicismo muito arraigado o fez várias vezes tentar abandonar,sem sucesso,a vida mundana e se dirigir ao retiro em mosteiros e igrejas.Muitos comentaristas reparam que concerto para órgão deste autor expressa este conflito de maneira escancarada,na alternância entre solene música organística e passagens em que o instrumento soa quase como um realejo de feira,tocando musica bem animada.Trata-se de um dos meus concertos favoritos.Já o senhor Britten,embora tenha escrito uma música que se poderia dizer algo conservadora,por meio da própria vida e da obra tentou defender suas visões de mundo,daí se compreende a afinidade dele com Shostakovich.As óperas deste autor sempre giram em torno de um personagem principal excluído da sociedade,muitas vezes sendo este personagem escrito para a voz do tenor Peter Pears,que em Sonho de uma Noite de Verão ou Curlew River por exemplo interpretou personagens femininos em travesti.Após a morte do compositor jornais do Reino Unido,que obviamente precisam de notícias escandalosas para venderem mais,assim é no mundo inteiro,baseados em novas biografias estão nos revelando que o artista amava platonicamente jovens imberbes e andróginos no início da puberdade,tais como os meninos soprano para os quais escreveu papéis como o de Miles na ópera A Volta do Parafuso.Aliás a última ópera do inglês é uma adaptação de Morte em Veneza de Thomas Mann estreada pouco depois do filme de Visconti.Parece a meu ver que ele se dividia entre a forma de amar dos gregos e a dos modernos.Essa foto acima ao lado da rainha merece também ser comentada,pois embora esse artista a vida inteira se bateu contra o status quo de seu país,foi adotado como uma espécie de compositor oficial da nação devido à linguagem acessível aliada a uma habilidade rara como compositor na outrora chamada "nação sem música".Isaac Carneiro Victal.
Muito bom artigo, Colarusso.
ResponderExcluir