CRÔNICAS DO BALÉ: A BELA ADORMECIDA NO MUNICIPAL DE SP.




   Os anúncios foram feitos com pompa e circunstância:  um balé russo viria a São Paulo. Pelo tamanho da divulgação,  parecia o Bolshoi ou o Kirov, mas era uma companhia russa da segunda divisão. Cenários surrados,  que rodaram o mundo,  e bailarinos medianos. Isso foi minha impressão do espetáculo. Cada cabeça uma sentença.     
   Uma senhora  com seus 60 anos senta-se ao meu lado. Seus olhos brilham, está encantada com o balé. Seu olhar mostra o mundo de magia que só o balé proporciona, emociona-se com as bailarinas, todas de branco, majestosas, lindas. A história se desenvolve leve, as agradáveis melodias de A Bela Adormecida, de Tchaikovsky,  deixam-na  em êxtase. Uma noite inesquecível para uma senhora e uma rotina para este que vos escreve.
   Converso com ela no intervalo, descubro que era sua primeira vez no Teatro Municipal de São Paulo. Conseguira o ingresso porque a patroa teve um compromisso de última hora, colocara sua melhor roupa. Estava maravilhada com o famoso teatro paulistano, tudo grandioso, bonito, glamouroso. Ela se sente uma artista de novela, uma Vera Fisher com vestido de gala entrando ao lado do Gianechini. 
   O chatão aqui começa a comentar a performance da trupe russa. Diz que a apresentação não é la essas coisas, os bailarinos são, no mínimo medianos. Uma apresentação que não vai deixar nenhuma saudade.
   A senhora discorda veementemente, para ela tudo está maravilhoso. Percebi isso pelo brilho de seus olhos. 
   Pensando bem, ela tem toda a razão: quem sou eu para discordar e quebrar o encanto? Pouco interessa se o pas de deux foi bem executado, ou se uma solista caiu de bunda no chão. Era sua noite de Cinderela, sua glória. Ninguém tinha o direito de quebrar essa magia. 
   Música Clássica, Ópera e Balé faz as pessoas viajarem por mundos indescritíveis. Quando comento que gosto de ópera e balé, todos lembram dos filmes onde os personagens vão a uma récita (Uma Linda Mulher,  com Julia Roberts,  é a campeã). Sonham com esse mundo, fantasiam e se divertem com isso. Essa noite será inesquecível na vida dessa senhora de 60 anos, o balé cumpriu sua missão. E eu aprendi a ser menos crítico nessas horas. 
Ali Hassan Ayache

Comentários

  1. Da minha parte noto que muitas pessoas no Brasil não se acham preparadas ou dignas para colocar os pés nos grandiosos teatros principais e salas de concerto do Rio e de São Paulo,de uma forma similar aos tempos do antigo regime na Europa.Claro não existe um proibição,mas é algo muito mais sutil o que as impede;por exemplo essa situação descrita acima se descambasse com o autor do testo esnobando a senhora,esta última talvez sentiria-se deslocada no novo ambiente e não ousasse mais transpassar seus limites.Também gostaria de frisar a grande quantidade de estrangeiros ou descendentes de imigrantes que podemos encontrar dentre o publico que vai ao Municipal e à Sala São Paulo.Isso me lembra a situação da orquestra da Índia em Mumbai,muito boa por sinal,que toca para um reduzido público composto por uma elite diplomática e uma minoria pársi,notórios admiradores da música ocidental e de onde surgiu a família Mehta,do maestro Zubin Mehta.A população do país mesmo desconhece a existência dessas orquestras.Isaac Carneiro Victal.

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    1. A grafia correta é "texto",perdão pelo péssimo português!Isaac Victal.

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