BARNUM - O REI DO SHOW : A LENDÁRIA SAGA DE UM MISTIFICADOR MOR EM MUSICAL EXEMPLAR. CRÍTICA DE WAGNER CORRÊA DE ARAÚJO NO BLOG DE ÓPERA & BALLET.
Barnum-O Rei do Show. Direção Gustavo Barchilon. Murilo Rosa, como Barnum. Março/2022. Foto/Caio/Gallucci. |
Phineas Taylor Barnum percorreu uma trajetória de quase meio século (1835-1891) como um mestre no ofício de prestidigitador do sonho americano alcançando, assim, sua fama como showman no universo circense. E de mistificador mor do encantamento através de uma exótica pulsão ao freak show (show de horrores) sustentada, ao mesmo tempo, pela vigarice e pela política.
Marcado pela simbologia de seu fabulário cotidiano – “a cada minuto nasce um otário”. E, também, de ser lembrado no centenário de sua morte, por um musical da Broadway de instantânea carreira e ocasionais versões posteriores, reforçadas com o lançamento de filme similar sobre sua vida por Hugo Jackman, em 2017.
Servindo, ainda de inspiração para o espetáculo Barnum – O Rei do Show, iniciativa brilhante do produtor/diretor Gustavo Barchilon para tornar mais luminosa a retomada em palcos brasileiros, pós surto pandêmico, do musical. Especialmente o anglo/americano, com todos os seus ingredientes de produção, intermediados pelo charme da tradição, através de mais uma das funcionais versões de Claudio Botelho.
Onde a paisagem cenográfica única (Rogério Falcão) é emoldurada pelo sugestionamento de um picadeiro circense frontalizado por um portal com sofisticados detalhes decorativos com um referencial barroquizante, que os efeitos luminares (Maneco Quinderé) ressaltam ora em tonalidades discricionárias ora em luzes vazadas. Estendendo-se a metaforização burlesca/circense ao visagismo (Dhiego Durso) e aos figurinos (Fábio Namatame) do corpo cênico, com prevalência de uma mais discricionária elegância na indumentária dos protagonistas.
Barnum-O Rei do Show. Direção Gustavo Barchilon. Giulia Nadruz, como Jane Lynd. Março/2022. Foto/Caio Gallucci |
Contando com um elenco de craques, desde o quarteto protagonista (Murilo Rosa, Sabrina Korgut, Giulia Narduz e a reveladora Diva Menner) ao lado de uma não menos brilhante trupe de músicos. No comando de Thiago Gimenes, apostando em arranjos antenados num sotaque mais contemporâneo, desafiando as limitações melodiosas da partitura original de Cy Coleman, sustentada na superativa ancestralidade de ritmos e acordes do ragtime, no entremeio de marchas e baladas.
De atração, à parte, no quase ininterrupto movimento de bailarinos/acrobatas com seu preenchimento energizado da caixa cênica, na pulsante corporeidade gestual imprimida por Alonso Barros. A partir de um substrato circense/atlético à base de saltos, malabarismos e piruetas, em suportes elásticos, entre arcos e sobre bolas gigantes.
Intercalado por performáticos solos, ora de palhaçaria, com um referencial da velha chanchada, ora por caricaturais personagens, como o menor general, o maior elefante ou a mulher mais velha do mundo. Desta vez, na histriônica representação da atriz trans pernambucana Diva Mener, dividindo-se ainda na sua efusiva interpretação cantante de cabaré em Black and White.
Murilo Rosa como o protagonista titular, desde o prólogo estabelece uma relação de carismática aproximação palco/plateia, ao questionar a acomodação dos espectadores, com narrativas ilusionistas no entorno de personagens inimagináveis e, inclusive, no malabarismo do andar sobre uma corda bamba. Como cantor revelando menor experiência vocacional, mas sem qualquer prejuízo de sua vibrante atuação atoral mesmo nos duetos de confronto de sua voz com a tessitura das protagonistas femininas.
De um lado Sabrina Korgut, deslumbrando por sua reconhecida maturidade vocal e sua simpatia dramática, no papel puritano da esposa Charity. Enquanto os dotes do experiente vocalismo lírico de Giulia Nadruz conectam lirismo e sensualidade, como a louríssima e sedutora cantora sueca de ópera Jane Lynd.
A qualitativa concepção diretora deste Barnum, ecoando das plagas além mar, aqui e agora, as vivências europeias do carioca Gustavo Barchilon, dos teatros do West End ao Cirque du Soleil, sob um primado de versátil inventividade cênica fazendo, enfim, deste musical um bravo desafio às atuais adversidades governamentais diante da criação cultural brasileira.
Wagner Corrêa de Araújo
Barnum - O Rei do Show está em cartaz no Teatro Casa Grande, sexta, às 20h30, sábado às 17h e às 20h30, domingo às 16h e às 19h30. Até 01 de maio.
Comentários
Postar um comentário