"MADAMA BUTTERFLY" JUSTIFICA OS APLAUSOS NO THEATRO MUNICIPAL DE SP. CRÍTICA DE MARCO ANTÔNIO SETA COM EXCLUSIVIDADE PARA O BLOG DE ÓPERA & BALLET.
A maioria das produções de "Madama Butterfly"– a pista está no nome – enfoca a fragilidade da heroína, a percepção de seu medo de que “na América, prendam asas de borboleta a uma tábua”. No ano em que se comemora o centenário da morte de Giacomo Puccini, célebre compositor da cidade toscana de Lucca, nascido em 22/12/1858 e falecido em Bruxelas a 29 de novembro de 1924. o Theatro Municipal em São Paulo, encena "Madama Butterfly", que já completou 120 anos de sua primeira representação no Teatro alla Scala, de Milão, ocorrida em 17 de fevereiro de 1904, obtendo após, a sua segunda versão com alterações no manuscrito e dividido o segundo Ato em duas partes no Grande Teatro de Brescia, a 28 de maio de 1904. A partir dessa apresentação a ópera sobre libreto de G. Giacosa e Luigi Illica do drama de David Belasco, baseado de um relato de J. L. Long, obteve sucesso gigantesco perante o público e a crítica especializada.
O Theatro Municipal de São Paulo viu, ao longo das décadas de sua existência, interpretações de Butterfly com nomes expressivos da cena lírica internacional: As cantoras japonesas Toshiko Hasegawa (1940),Atzuko Azuma, Yasuko Hayashi, Mietta Sighele, Michele Crider, Eiko Senda e os sopranos brasileiros Violeta Coelho Netto de Freitas (1943); Anna Faraone (1955); Hercília Block (1958 e 1961); Aurea Gomes e Norma Cresto (1984) encenadas com criatividade e glamour.
Os personagens de “Madame Butterfly” ganham vida com detalhes e emoções requintadas. A inocência e vulnerabilidade de Butterfly, as emoções conflitantes de Pinkerton e a dedicada Suzuki criam uma tapeçaria de experiências humanas que ressoa no público. À medida que seus relacionamentos evoluem e se entrelaçam, a exploração do amor, da traição e do sacrifício na ópera torna-se profundamente pessoal.
A trilha sonora de Puccini para “Madame Butterfly” é um tesouro de melodias emotivas que aumentam a profundidade emocional dos personagens e de suas jornadas. Da comovente “Un bel dì vedremo” ao enternecedor “Humming Chorus”, no Intermezzo, a música captura a gama de emoções humanas; do otimismo crescente "Viene la sera...Bimba dagli occhi pieni di malia" e "Scuoti quella fronda"; ao desespero devastador "Tu, tu, piccolo Iddio"!
Na noite de 15 de março de 2024, o Theatro Municipal lotou as suas dependências para ver a nova produção de "Madama Butterfly". Ha que se registrar uma observação quanto à encenação de Lívia Sabag, apesar de um trabalho muito aceitável, diante das mediocridades que se vêem apresentando nesses últimos anos no Municipal de São Paulo. Ao que se refere ao Ato I, é necessário esclarecer que Sabag propõe uma visão realista, árida, japonesa da obra; isto posto, é necessário frisar que a situação sócio-financeira da protagonista, encontrava-se equilibrada, possuía três serviçais ao seu redor, ainda que sustentada por Pinkerton em sua casinha, no alto da colina em Nagasaki, alugada para ser o ninho de amor entre os dois. e precedido por um período em que ela fazia-se gueixa, possuía as suas economias pessoais, apoiada por seus familiares, situação esta que só vai perder tais privilégios, a partir do início do Ato II, quando do abandono do marinheiro; indaga-se aí uma indevida antecipação de sua decadência sócio econômica. Cenário árido, já no Ato I com cerejeira esturricada em plena primavera, nos dá inverossímil credibilidade. Nicolàs Boni se equivocou.Os figurinos de Sofia Di Nunzio são aceitáveis, e a iluminação de Caetano Vilela, desta vez decepcionou; muito convencional. As projeções de vídeo, ( de Ozu ) , com Cary Grant e Charlie Rugggles, enriqueceram a acuidade visual do público.
A Orquestra Sinfônica Municipal nas mãos de Roberto Minczuk obteve uma tendência de ralentar os andamentos dos tempos normais, que também imprimiu intensidades inapropriadas a contemplar as realidades vocais dos cantores.
Vale considerar, de início, o binômio Puccini-autenticidade, ou seja, o veemente liricismo pucciniano, do qual Puccini tinha a preferência sobre as intérpretes, cujas explosões melodramáticas dos grandes sopranos ocidentais, de vozes generosas, com agudos poderosos etc (Antonietta Stella, Renata Scotto, Asmik Grigorian, Sonya Yoncheva, Saioá Hernandez, Lianna Haroutonian e Maria Jose Siri) que servem à música de Puccini, sem se preocuparem com a verossimilhança do personagem. Como Butterfly, a italiana Carmen Giannattasio assim procedeu. Voz grande de soprano lírico spinto soube apropriar os seus recursos neste tão difícil personagem. Apenas não apresentou pianissimos em todo o decorrer da ópera, o que denota poucos recursos técnicos nesse particular. Os agudos poderosos que emitiu no transcorrer da ópera fizeram com que, em alguns momentos, essas deficiências vocais ficassem em segundo plano. Foi aplaudidíssima ao final do espetáculo. No elenco alternativo há a presença de Eiko Senda e Enrique Bravo, ambos de qualidades excepcionais (dias 16, 19 e 22/3).
No tenente norte-americano Pinkerton, o tenor espanhol Celso Albelo, bem em cena, claudicou nas notas mais agudas do dueto ao final do Ato I,(Ah! dolce notte!) e na ária "Addio fiorito asil" faltaram-lhe sutilezas pecando no excesso dos portamentos. Afinação e emissão oscilantes.
Haveria que elogiar ainda o bom trabalho do mezzo soprano Ana Lúcia Benedetti numa fiel e dedicada Suzuki, que soube muito bem dosar a densidade dramática de suas intervenções junto a Cio-Cio-San e também no retorno de Pinkerton no Ato III. O Sharpless de Douglas Hahn denota forte desgaste vocal, ainda que atue com eficiência. Jean William se destacou em um Goro, o casamenteiro, gestualmente preciso, porém de timbre vocal, sem maiores qualidades. E é possível assinalar os bons timbres, apesar de serem, muitas vezes encobertos pela excessiva sonoridade de uma orquestra incontida. A voz de Andrey Mira, baixo, desta feita como o tio Bonzo, foi regular, fazendo o possível nos seus limites vocais; Carlos Eduardo Santos, barítono (Príncipe Yamadori); Leonardo Pace (Comissário Imperial); Sebastião Teixeira, barítono (Oficial do Registro); os parentes de Butterfly (Marcio Marangon, Magda Painno, Caroline de Comi e Graziela Sanchez) o Coral Paulistano no comovente " coro a bocca chiusa ": boca fechada, que encerra o Ato II. Ao final ainda o mezzo soprano Elaine Martorano compôs uma Kate Pinkerton sensível e contida.
Sem grandiloquência nem falsidades, e graças ao olhar sensível da diretora de cena, a Régisseur Lívia Sabag, a nova produção apresentada, consegue sublinhar o que continua a fascinar-nos à obra de Puccini: a imensidão do pequeno, a força do preconceito e do frágil, e sobretudo a grandeza da dignidade humana.
Escrito por Marco Antônio Seta, em 17 de março de 2024.
Jornalista inscrito sob nº 61.909 MTB .
Concordando com o autor da matéria, jornalista, Marco Antônio, e presente na estreia da Madama Butterfly, não posso deixar de apontar que a fragilidade da protagonista e o abandono imposto pelo seu “marido”, marinheiro que já de início, debocha das condições frágeis da união que iria estabelecer no Japão. Olvidou todas as características culturais e pessoais da esposa e em seu retorno a encontra devastada, emocional e financeiramente, pelo longo abandono. É arrazador!
ResponderExcluirSou leitor assíduo das apreciações de Marco Antonio sobre os espetáculos operísticos que acontecem em São Paulo. Além do consistente conhecimento histórico, provavelmente fruto de seu gosto pelo gênero, enfatizo a amplitude das análises, contemplando todos os aspectos do evento com equilíbrio e sensatez, elogiando o que é merecido e pontuando, com respeito e ponderação, as inevitáveis deficiências de uma montagem tão desafiadora.
ResponderExcluirAssisti a estreia e fiquei decepcionada. Posso estar enganada, mas aparentemente havia algum problema na acústica do teatro, as vozes soavam abafadas. Mesmo assim, impossível não notar a atuação medíocre do tenor Celso Albelo, cujos agudos mal se ouviam e deixou a desejar na interpretação do cinismo e posterior arrependimento do oficial americano. A Cio Cio San da soprano é no máximo aceitável, já que as notas agudas eventualmente emanadas, agrediam os tímpanos, após prolongados momentos de sussurros quase inaudíveis. Assim, a peça oscilava entre o drama e o cômico. Madame Butterfly certamente não é o melhor trabalho de Puccini, especialmente considerando a personagem feminina central que não se compara a passional Tosca, a doce e comovente Mimi, ou a implacável Turandot. O cenário paupérrimo, ainda assim foi superior a montagem vermelha da Tomie Ohtake. Enfim, foi preciso muito esforço para não dormir.
ResponderExcluirMadama Butterfly seria uma das melhores coisas que Puccini escreveu, musicalmente bem mais elaborada que as duas obras que Puccini estreou antes dela, estou repetindo quase um consenso. Nunca vi uma pessoa negar colocar Butterfly entre as melhores obras de Puccini. Isaac Carneiro Victal.
ExcluirMarco Antônio Seta acrescenta: Esta não é uma produção perfeita de forma alguma, o equilíbrio pobre entre orquestra e cantores é o que causa mais danos. Mas é altamente impressionante como uma exposição da tragédia na obra em todos os seus detalhes sangrentos; também é impressionante ao colocá-lo em um contexto autenticamente japonês, nas performances de Eiko Senda e Enrique Bravo (Pinkerton) que tão esplendidamente viveram os seus personagens em 16, 19 de março, no Theatro Municipal de S. Paulo.
ResponderExcluirNinguém sabe quem é você kkkkkk
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