O CENTENÁRIO DE LUIGI NONO VAI SER ESQUECIDO ASSIM COMO FOI O CINQUENTENÁRIO DE ROBERTO GERHARD? ARTIGO DE ISAAC CARNEIRO VICTAL NO BLOG DE ÓPERA & BALLET.



Criticamos muito a Revista Concerto mas também sabemos reconhecer quando eles acertam. João Marcos Coelho acaba de reclamar num artigo publicado no site dessa revista sobre o fato de nenhum conjunto musical brasileiro programar sequer uma peça de Luigi Nono para comemorar o centenário dele! Acrescento o mesmo aconteceu no cinquentenário de Roberto Gerhard. Esses são dois dos melhores compositores de vanguarda e experimentais, completamente ignorados nesse país isolado e provinciano...Luigi Nono é um compositor de esquerda que rompeu com a estética do realismo socialista imposta pelo partido comunista da URSS e usou todos os recursos de vanguarda para denunciar a miséria do mundo e os problemas dos fracos e menos favorecidos, seguindo uma estética expressionista. Também rompeu com a corrente de Boulez, dominante nos meios musicais experimentais, que preconizava uma música abstrata e não envolvida com política. Assim como não é preciso ser crente para gostar de Bach, não é preciso ser comunista para gostar de Nono, mas a música dele é realmente avançada, feita sob medida para "épater le bourgeois".Ele se casou com a filha de Schoenberg, Nuria, que por sua vez nasceu em Barcelona terra de Roberto Gerhard, aluno de Schoenberg. Expulso da Espanha com a vitória de Franco por motivos políticos, só conseguiu retornar para passar feriados no litoral da Catalunha. Se exilou na Inglaterra onde foi o primeiro a escrever música eletrônica no Reino Unido. É notável comparar como a música de Gerhard é moderna diante dos compositores ingleses da época dele. É uma obra muito original, como Gerhard afirmou "o sentido da música é o som". O referido músico parece conseguir uma mistura impossível de dodecafonismo e atonalismo da Segunda Escola de Viena com um sensualismo que lembra a estética impressionista e ademais umas pitadas de folclore espanhol.De Luigi Nono recomendo Polifonia Monodia Ritmica, que cita uma musica folclórica brasileira apresentada a ele por Eunice Catunda, peças corais como Ha Venido ou Donde Estas Hermano, dificílimas de cantar, os Epitáfios para Garcia Lorca e minha obra preferida dele Como una ola de fuerza y luz, para soprano, piano, orquestra e fita magnética. Gravada por Abbado, Pollini e a Radio Baviera e também pelo maestro Herbert Kegel, o "Karajan da Alemanha Oriental". O Scala de Milano acaba de homenagear Nono apresentando essa obra com direção de Metzmacher e Pierre-Laurent Aimard ao piano. É uma música tão moderna que faz as peças atonais de Schoenberg parecerem uma coleção de cantigas de ninar...De Gerhard recomendo seu Concertino para Cordas, seus concertos para violino, piano e cravo, as danças do balé Don Quixote e as suítes dos balés Soirées de Barcelone e Pandora, também suas sinfonias e a cantata The Plague. Vários maestros importantes como Bernstein, Antal Dorati e Colin Davis interpretaram a música de Gerhard, assim como Nono teve defensores com Gidon Kremer, mas ambos autores continuam ignorados pelo público.Eu me uno ao protesto iniciado pelo artigo que apareceu na Revista Concerto falando sobre o esquecimento do centenário de Nono, ainda acrescentando um protesto por ter passado em branco o cinquentenário de Gerhard, ocorrido em 2020. É inadmissível que isso esteja acontecendo com dois gênios como esses, como podem jogar no limbo essa música extraordinária? Eu já perdi as esperanças de ver tocada uma obra com a OLA de Nono no Brasil durante a minha vida! Digo o mesmo sobre a cantata A Peste/The Plague ou acerca do concerto para violino, obras primas de Gerhard. Nenhuma censura política limita tanto o horizonte quanto a burrice e a ignorância!Isaac Carneiro Victal

Comentários

  1. Gostaria de acrescentar que assim como já perdi as esperanças de ver tocada enquanto eu viver uma obra como a OLA de Nono no Brasil, digo o mesmo sobre a cantata A Peste/The Plague ou acerca do concerto para violino, obras primas de Gerhard. Nenhuma censura política limita tanto o horizonte quanto a burrice e a ignorância! Isaac Carneiro Victal.

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  2. Comentário de Osvaldo Colarusso no Facebook:
    "A música de Nono como "A floresta é jovem e cheja de vida" (com j mesmo) e "Como una ola de fuerza y luz" se tornaram datadas, velhas, panfletarias. Mereciam ser mais conhecidas suas obras primas instrumentais como ... Sofferte onde serene para piano e fita magnética, Fragmente—Stille, an Diotima para quarteto de cordas ou uma obra vocal como Il canto sospeso . Como toda obra com muito peso panfletário a maior parte da obra de Nono envelheceu mal. Quanto a chamar as obras de Schoenberg de canções de ninar poderia se dizer que é um "excesso poético" mas na realidade é uma derrapada feia..."

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    1. Discordo sobre as referidas obras terem envelhecido mal. Por outro lado as obras instrumentais citadas continuam tão ignoradas quanto as obras políticas. O fato de ninguém programar nada de Nono em seu centenário no Brasil, segundo a Concerto que conta com informações privilegiadas, diferente de nosso blog, para mim esse esquecimento seria o escândalo do ano. Sobre a comparação que fiz, quis enfatizar o contraste entre a música baseada em clusters e fita magnética de Nono com muitas peças atonais e dodecafonicas da Segunda Escola de Viena que muitas vezes são escritas em dinâmicas suaves. Exemplo as Seis Peças para Orquestra de Webern, obra extremamente revolucionária, mas que tem apenas breves momentos em fortíssimo. Isaac Carneiro Victal.

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  3. Comentario de Antônio Carlos Melo Pereira no Facebook: É preciso se perguntar se uma obra musical se comunica somente a uma centena de pessoas iniciadas, não se perpetuando no gosto do publico em geral, isso ainda é uma obra de arte? Sério, uma das características de uma obra de arte é a comunicação, então se apenas uma porcentagem muito pequena do publico se interessa p/ essa obra há a tendência de ser esquecida não é mesmo?
    Atualmente a maioria dos espetáculos/ concertos são patrocinados por instituições promotoras de cultura ( c/ leis de incentivos)e ou secretarias de culturas, ou seja $$ público.
    Se esses compositores e músicos dependesse da venda de ingressos, o que aconteceria??

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    1. O que tem a ver o valor de uma obra de arte com o reconhecimento dessa obra pelo grande publico? A maioria das pessoas carece de estudos necessarios para apreciar uma obra de arte. Indo por esse caminho sugerido por Antonio Carlos Melo, a própria música clássica estaria na berlinda, pois afinal, ainda mais no Brasil, apenas um público ínfimo se interessa por ela. Argumento parecido usado por quem defende a demolição de prédios históricos que custam caro para serem mantidos e que sao ignorados pelo povo ou pede o fechamento de museus que não atraem muito público. Ou seja a defesa da barbárie! Isaac Carneiro Victal.

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    2. A música clássica está na berlinda...

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  4. Francamente não vejo ninguém tocar a música de Nono em parte alguma do mundo, exceto festivais de música contemporânea em efemérides. Não acho que é uma razão para se criticar o cenário musical brasileiro. Quem o vê como um autor essencial que o toque e cante. Gerhard é espetacular, mas lembremos que 2020 foi aniversário de Beethoven e o ano do lockdown, portanto nem Beethoven foi muito tocado. Ele é apresentado com frequência na Inglaterra, quase nada na Europa e nada em outros países.

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    1. Deixei bem claro que, por causa dos 100 anos de nascimento de Nono comemorados agora, pelo menos alguma obra dele algum grupo que seja deveria interpretar no Brasil, uma terra enorme e superpopulosa. Nem isso. Isaac Carneiro Victal.

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    2. Eu inclusive citei o Scala de Milano por ter recentemente programado a OLA de Nono, um palco onde normalmente se apresentam as grandes óperas do repertório e não música experimental. Sobre a programação de obras de Gerhard, a suíte de danças do balé Don Quixote foi tocada não tem muito tempo pela Filarmônica de Berlim e Simon Rattle, juntamente com a terceira sinfonia desse compositor. Também existe um vídeo no YOUTUBE da orquestra da Radio e TV da Espanha interpretando as danças do referido balé. O espanhol acredito ser mais tocado que o italiano, pois Gerhard tem obras num estilo mais tradicional, já Nono parece não ter escrito nada importante que não seja extremamente moderno desde o início da carreira. Também citei intérpretes bem conhecidos como Abbado, Pollini e Gidon Kremer que gravaram Nono e Bernstein, Colin Davis e Antal Dorati que gravaram ou executaram a música de Gerhard, não estou falando em conjuntos de câmara especializados em música de vanguarda como o quarteto Arditti. Enquanto isso o grande público ignora esses autores. A música de ambos aliás continua a ser gravada com frequência. Isaac Carneiro Victal.

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