BALANÇO DA APRESENTAÇÃO DE "NABUCCO" NO THEATRO MUNICIPAL DE SP. CRÔNICA DE MARCO ANTÔNIO SETA EXCLUSIVA PARA O BLOG DE ÓPERA & BALLET.

         Cena da ópera com Alberto Gazale (Nabucco) e Luisa Francesconi (Fenena); Coro Lírico Municipal ao fundo da cena. 

 "Já há três meses estavam esgotados os ingressos no Theatro Municipal de São Paulo para a ópera Nabucco, de Giuseppe Verdi. Mas quem foi ver a ópera encontrou algo diferente do anunciado.

De cara, chama atenção o “cenário”, com um grande espelho móvel que de início reflete o maestro no fosso da orquestra, e um grande tecido drapeado que é incorporado ao vestido da protagonista ao centro de um tablado de madeira.

O espelho se divide em partes, e se move durante todo o espetáculo. Também serve como tela de projeção, onde filmagens feitas ao vivo são reproduzidas – closes dos protagonistas cantando, múltiplas imagens sobrepostas, e até imagens feitas pelos cantores segurando a câmera enquanto cantam (o que é algo bem esquisito, para dizer o mínimo).

Tantos elementos precisavam ser harmonizados em função do enredo da ópera. Só que isso não aconteceu. Na verdade, a montagem é altamente dispersiva: vemos, por vezes, no palco ao mesmo tempo, o coro, os cantores, a projeção da imagem dos cantores, o reflexo do coro no espelho – é informação demais para assimilar, informação que não tem função dramática.

Mas o pior ainda está por vir: a diretora Christiane Jatahy cortou cenas inteiras da ópera, como a cena da aliança de Zaccaria com Nabucco, todo o trecho inicial da primeira parte do terceiro ato, e ainda fez acréscimos: uma peça musical não composta por Verdi foi acrescentada ao final, escrita recentemente por Antonino Fogliani. No final, foi acrescentado também uma repetição do famoso coro “Va’, pensiero” a capela, com o coro posicionado na plateia.

Todas essas alterações tem uma função clara: a politização do enredo da ópera e tentativa de atualização para os dias atuais. O que, aliás, é uma tentativa fadada ao fracasso: trazer a história do rei Nabucodonosor II da Babilônia para o ano de 2024 não tinha a menor chance de dar certo.

O coro estava vestido com roupa atual, pareciam ter entrado no teatro com a mesma roupa que vieram do metrô, e o enfoque racial e identitário se revelava a todo momento, nos closes e na falas, chegando ao ponto de um integrante do coro gritar “Palestina livre”.

Autoria de Josias Teófilo da Crusoé; "Um palco para a enganação. Theatro Municipal de São Paulo engana o público com dinheiro público".  Publicado em 07.10.2024  no operaeballet.blogspot.com.br

Mais adiante há observações de relevo com respeito à produção da ópera Nabucco recentemente apresentadea no Theatro Municipal; vejamos a seguir: 

"Sem dúvida, a coisa mais horrível que ví no palco do Municipal neste ano. Minha sensação foi a de ver pessoas enlouquecidas correndo de um lado para o outro, luzes que queimavam a retina de quem estava próximo na platéia ou nos balcões e foyer do teatro, uma pobreza cenográfica e cara, afinal aquele laguinho nocentro do palco, não deve ter sido simples de fazer e não agregou nada. 
A diretora Jatahy se disse cheia de conceitos e fui procurar entender; mas mesmo explicando fica difícil de engolir, imagine sem explicar. Tenho comigo, que se precisa explicar muito, é porquê não está bom. Destaque positivo para a orquestra e coro lírico municipal que garantiram bons momentos, em que somente de olhos fechados, foi possível suportar o {espetáculo}" Escrito por Ricardo Marcel; em comentários na Revista Concerto, em 06.10.2024

Nabuccadas a seguir:

 Os jovens que foram assistir a essa ópera além de não entenderem nada nunca mais voltarão.

Nabuccada VIII - Pelo andar da modinha nutela em breve os solistas soltarão flatulências no palco e os moderninhos vão aplaudir como se fosse a genialidade de um Zeffirelli.

Nabuccada IX - Inventaram um interlúdio final composto por Antonino Fogliani decepando a cena final original da ópera.

Nabuccada X - Primeira vez que ouço ópera com gravação em alguns trechos. 

Nabuccada XI - Como sempre fazemos produções novas ao invés da guardar e reativar as antigas para reduzir custos como fazem todos os teatros do mundo. Somos "muito ricos" e por isso não precisamos de um acervo de óperas. Um Nabucco em 2017 e outro diferente em 2024 é como jabuticaba, só tem no Brasil.

 - O Coro Lírico sob comando de Érika Hindrikson foi o destaque apesar de quase sempre estar separado. Tirou leite de Pedra. 
Autoria de Ali Hassan Ayache, em 03.10.2024 (Opera&Ballet)

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                         O tenor Enrique Bravo enalteceu o elenco principal nas vestes de Ismaelle

Saí do Municipal com uma pergunta na cabeça: por que Marigona Querkezi não cantou no elenco de estreia? Essa e outras perguntas semelhantes foram feitas ao longo de 2024 pelo público instruído que frequenta a casa. Eu não vi, mas conheço quem jure que o barítono Bongani J Kubheka, que interpretou Escamillo em Carmen, também deveria ter integrado o elenco de estreia da produção apresentada em maio.

Já passou da hora de o Theatro Municipal de São Paulo parar de errar nas escalações de elenco. Já está se tornando constrangedor para a casa sempre divulgar a sua programação com elenco “a definir”: tal prática dá a entender que os cantores, tão importantes para a ópera, são apenas “um detalhe” para o TMSP." ( palavras de Leonardo Marques, em10.10.2024. (notasmusicais)

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      O soprano Marigona Qerkezi, a Abigaille do elenco alternativo

Pois bem, conclui-se que nesta produção de "Nabucco", nunca se viu algo pior em termos de produções, fossem nacionais ou internacionais. A  ópera mestra e das mais importantes da história da ópera italiana, na trajetória incomparável do mestre Giuseppe Verdi, que se impôs, já a partir dos concertatos finais dos Atos I e II;  como compositor lírico em sua primeira etapa no cenário operístico da Itália, em 1842, quando de sua estreia no Teatro alla Scala, de Milão, que também efetivou-se através de outras encenações aqui em São Paulo, no Rio de Janeiro, em seus Teatros Municipais,  no Theatro da Paz em Belém do Pará ou no Palácio das Artes de Belo Horizonte

Citem-se aqui por exemplo; a vinda do Teatro San Carlo de Napoles, em excursão pelo Theatro Municipal do Rio de Janeiro, e após, ao nosso Teatro Municipal, em São Paulo, numa produção que ficou na memória, de todos aqueles que tiveram o privilégio de assistí-lo, em setembro de 1969. Os maiores intérpretes da época, nos visitaram, com estrondoso sucesso. 

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 Sala de espetáculos do Teatro San Carlo di Napoli

Após viu-se no Rio de Janeiro, em 1982 a produção espetacular de "Nabucco" sob a direção musical de Romano Gandolfi, com a grandiosidade cênica de Paolo Bregni e um elenco estelar com Matteo Manuguerra, e Fernando Teixeira (elenco em alternância); o soprano brasileiro Áurea Gomes como Abigaille, espetáculo este, reposto em cena em 1984, desta vez, com o barítono Mauro Augustini e novamente Fernando Teixeira com Áurea Gomes, Eduardo Alvares, Michael Burt, Joy Davidson, sob a batuta do competentíssimo Anton Guadagno. 
E em São Paulo, pudemos conferir a produção de Cleber Papa,  em 2017 com elenco inteiramente nacional.  Há paralelamente uma série de DVDs de vários teatros com produções de Nabucco, para se comparar e nos referenciarmos com a qualidade ora apresentada. 

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Alberto Gazale como Nabucco

Os cortes das cenas e da instrumentação na orquestra:

Várias as passagens simplesmente mutiladas na ópera; como a cena em que Zaccaria estabelece a sua aliança ao final da ópera, aqui cortada (Zaccaria e Nabucco) "Servendo a Jeovha, sarai de'regi il re".
Outra passagem importante é o início da terceira parte: "È l'Assiria una regina" um coro jubiloso,  e na sequência, decide cortar todo o trecho inicial da primeira parte do terceiro ato, da qual resta apenas o dueto entre Nabucco e Abigaille "Donna, chi sei?". Desta forma, consequentemente, o público não é informado que o decreto da morte de Fenena foi sugerido a Abigaille pelo líder religioso da Babilônia. Mais ainda, o maestro regente, apresentou a orquestra com apenas uma harpa, considerando-se que na partitura de Verdi, são apontadas duas harpas, como procede em todas as interpretações no mundo.  Ainda no Ato I, não somente a exclusão da harpa,  passou totalmente desapercebido por muitos espectadores e até a alguns da crítica especializada, que pela primeira vez, na história do Teatro Municipal, as intervenções da Banda Sul Palco, e repetidas nos subsequentes  Atos  desta ópera,  foram projetadas com uma "Gravação"; não havia uma Banda na coxia, como deveria acontecer. Aí estampada uma grande economia para a Sustenidos Organização Social de Cultura (???), ao deixar de contratar músicos extras para a composição dessa Banda. 
Da mesma forma a mencionada Sustenidos,  não faz a mínima questão em recuperar o grandioso órgão Tamburini, de tubos e com som de Catedral, instalado no Municipal, em 1969, órgão este que foi também excluído na execução do Quadro II da Parte III desta produção de Nabucco. A propósito o Tamburini já está,  há oito (8) anos, (2017-2024) sem utilização em diversas óperas, sinfonias ou recitais desse secular instrumento, cujo descaso recai, sobretudo ao maestro titular da Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo e da Sustenidos Organização Social de Cultura. 
Um crime este órgão de tubos sucateado, que hoje somente ornamenta a sala de espetáculos do Theatro Municipal, considerando-se que a população de São Paulo, pagou muito caro pela sua reforma, há anos atrás. Quanta enganação.
E a ópera não teve o seu final original, trocado pelo interlúdio composto por Antonino Fogliani que decepou a ópera.
 
Escrito por Marco Antônio Seta, em 10/10/2024
Jornalista inscrito sob nº 61.909 MTB / SP

Comentários

  1. Nada como alguém, mestre em espetáculos operisticos, nos apresente crítica tão retumbante e alicerçada em fatos, para esclarecer os menos entendidos de que há necessidade de se observar certa logística para se obter um resultado coerente com a obra que o compositor concebeu e que a mesma não seja aviltada.

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