PALÁCIO DAS ARTES DE BELO HORIZONTE OSTENTOU BRILHO COM A ÓPERA "NABUCCO", DE VERDI. CRÍTICA DE MARCO ANTÔNIO SETA EXCLUSIVA PARA O BLOG DE ÓPERA & BALLET.

     


Não se pode falar em Nabucco sem escrever sobre o início da carreira de Verdi. Aos 29 anos, acabrunhado pela morte da mulher e de seus dois filhos por grave enfermidade, e pelo malogro de suas duas primeiras óperas, Giuseppe Verdi isolou-se no sofrimento, decidido a encerrar sua carreira artística. Foi quando  Merelli, empresário do Scala, acenou-lhe com o libreto de Nabuccodonosor, de Temistocle Solera (1815-1878) em que as lamentações dos judeus, no cativeiro da Babilônia, se identificavam com os anseios de liberdade do povo italiano, sob o domínio da Áustria. E, então, as paixões políticas despertaram, a uma vez, o patriota e o gênio:  Verdi empolgou-se pelo poema e a música surgiu-lhe em caudal.

                    Foi uma consagração a estreia do Nabucco no Teatro Scala de Milão, na memorável noite de 9 de março, de 1842; o público aplaudiu fragorosamente, consciente de que encontrara o canto de protesto da terra oprimida. O coro "Va , pensiero, sull'alli dorate", tornou-se o hino irredentista da Itália, trauteado onde quer que surgissem oficiais austrícos. E quanto à qualidade da música, Nabucco surpreende,  ainda hoje, pela arquitetura sonora e pela autenticidade com que são caracterizados alguns personagens: os conflitos individuais e coletivos são expressos com força e vigor, tendo papel preponderante os metais e a percussão da orquestra. Também, na utilização dos trios, quartetos e  quintetos vocais, recheados de coros, altamente dramáticos, que viriam a ser. com o tempo, uma das marcas registradas do grande compositor de Ernani, Attila, Macbeth, Jerusalem, Simon Boccanegra, Don Carlo, Aida, Otello. 
                                                           Giuseppe Verdi ainda jovem quando compôs "Nabucco" em 1842.

     No seu conjunto, pela montagem grandiosa e bem cuidada, há que se frisar a competência musical e a precisão na regência de Ligia Amadio pela sua superior direção  no que se refere à Orquestra Sinfônica de Minas Gerais e aos demais componentes do espetáculo em epígrafe, pela inteligência da direção cênica e excelente desempenho do Coral Lírico de Minas Gerais, na apresentação do Palácio das Artes de Belo Horizonte em 17, 19, 21 e 23 de outubro de 2024.  

             O protagonista foi o barítono Rodrigo Esteves de voz com bom volume e bem conduzida, dominou a atenção de todos em suas entradas. Cantou e representou com propriedade o Nabucco e  não se pode deixar de destacar o 1º Quadro  do Ato IV quando cantou a prece ""Dio di Giudá". obtendo aplausos instantâneos. 
             No difícil personagem de Abigaille o soprano lírico "spinto" Eiko Senda assumiu o papel que Verdi escreveu com vistas a Giuseppina Strepponi; soprano dramático verdadeiro, e que se tornaria sua esposa meses após, exige uma voz heróica, grande extensão e volume, além de invulgar apoio nos graves. Artista inteligente, contudo, venceu satisfatoriamente os inúmeros escolhos da violenta partitura. Exibiu linda voz, igual e de belo timbre, bem conduzida em belas projeções e emissões de perfeito domínio técnico. Deixou patente a sua predileção ao personagem no grande recitativo "Ben io t'invenni, a ária "Anch'io dischiuso un giorno" e a cabaletta "Salgo giá del trono aurato", notavelmente interpretados. Registre-se ainda a sua performance no dramático dueto com Nabucco  <"Donna, chi sei " ?  no Ato III, com extraordinário domínio cênico-vocal. Foi aplaudidíssima. 
             O baixo Savio Sperandio viveu o sacerdote Zaccaria:  já na sua primeira ária ""D'Egitto la sul lidi" demonstrou afeição a esse grande papel com boas emissões em seu canto; porém na grande profecia "Tu sul labbro" do 2º ato, onde verifica-se como Verdi vai descobrindo os segredos do seu ofício, no belo solo de cello, ; e acompanhamento dos violoncelos para essa ária, a voz de Sávio apesar de muito sonora nos sons médios e agudos,  apresentou bastante oscilações  nas notas graves e profundas; bem como no "Oh, chi piange ?.....A posare sui crani, sull'ossa".(Ato III).
               O duo amoroso coube ao tenor Giovanni Tristacci como Ismaele numa interpretação apenas correta, sem predicados a grifar,  e ao meio soprano Denise de Freitas ( como a irmã cacula Fenena). 
O arioso "Oh, dischiuso è il firmamento"!  apesar da inclusão de agudos inexistentes na partitura original, foi apenas regular e,  no Gran Sacerdote de Baal foi o baixo Cristiano Rocha, de voz generosa e bem colocada. A registrar ainda a participação do soprano Fabíola Protzner (Anna) de eficaz musicalidade e o tenor Júlio Cesar Mendonça (Abdallo) de um timbre metálico e bastante oscilante na afinação.
                Orquestra excelente e o Coral Lírico de Minas Gerais ofuscou em suas atuações,  sob a preparação musical do maestro Hernán Sánchez Arteaga. Os cenários de Renato Theobaldo são bonitos e funcionais; com figurinos no capricho elegante de Marcelo Marques (belos os de Fenena e de Abigaille); concepção e direção cênica de André Heller-Lopes; (direção assistente de Menelick de Carvalho);  com desenho favorável de luz de Fabio Retti e a direção geral de conhecimento e competência de Cláudia Malta


Marco Antônio Seta viajou especialmente a Belo Horizonte para apreciar a produção de
         "Nabucco" no Palácio das Artes de Belo Horizonte.(Fundação Clóvis Salgado).Récita de   19/10/2024
          Marco Antônio Seta é jornalista inscrito sob nº 61.909 MTB ;
          Licenciado em Artes Visuais, pela UNICASTELO, em São Paulo/SP;
          Diplomado pelo Conservatório Dramático e Musical "Dr. Carlos de Campos", em Tatuí, SP;   Diplomado pelo Instituto de Educação Estadual "Peixoto Gomide", de Itapetininga, SP,    Diplomado pela Academia Paulista de Música     

Comentários

  1. Bravo! Que critica mais pungente. Marco aborda todos os aspectos importantes trazendo seu notável saber para apontar os pontos positivos e os não tão nobres. Profundo conhecedor do bel canto possui o talento de nos trazer o palco para o papel nos brindando com mais uma joia de crítica. Oxalá tenhamos um ano venturoso em nossa cidade, tão carente de espetáculos que promovam a beleza e arte dos grandes compositores.

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