FAUST – Met Live em HD, Fundação Gulbenkian, Dezembro de 2011

 Texto do amigo de Portugal, FanaticoUm , que assistiu ao mesmo Faust de Gounod transmitido nos cinemas brasileiros, direto do Metropolitan Opera House de Nova Yorque. Agradeço ao amigo FanaticoUm pelo excelente texto. Publicado  originalmente no blog Fanáticos da Ópera: http://fanaticosdaopera.blogspot.com/



(Review in English below)

Faust de Charles Gounod é uma ópera lírica em cinco actos com libretto de Jules Barbier e Michel Carré. O enredo pode ler-se aqui

A encenação no Met foi do canadiano Des McAnuff. A acção foi transportada para o início do século XX, no período entre as duas guerras mundiais. O filósofo Faust é aqui um velho físico nuclear que trabalha num laboratório onde se desenvolve a bomba atómica.

(Fotografias / Photographs de Ken Howard / Met Opera)

Pensa suicidar-se ingerindo veneno mas, depois de invocar o diabo e lhe vender a alma aparece, do meio do fumo, jovem e impecavelmente vestido e assim continuará até à cena final. Mefistófeles está vestido de forma idêntica a Faust, mas usa um laço, uma gravata ou uma flor escarlate na lapela.



O cenário é em metal, relativamente vazio, ladeado por duas escadas de caracol, com três voltas, constantemente utilizadas nos movimentos cénicos, semelhante à encenação que Jean-Louis Martinoty concebeu para o Faust de Paris, como se pode ver aqui. Esta estrutura serve de base a toda a encenação que beneficia de frequentes projecções vídeo.
No 4º acto, a chegada dos militares da guerra e o reencontro com as famílias é um dos momentos mais bem conseguidos.
No final, Marguerite sobe ao céu numa escada que surge no centro (posterior) do palco e Faust, novamente velho, reaparece no seu laboratório e suicida-se por ingestão do veneno.

Confesso que de início não gostei mas, com o desenrolar do espectáculo, fui achando que acabou por funcionar, apesar de não ter trazido nada de muito inovador.
A direcção musical foi do jovem maestro canadiano Yannick Nézet-Séguin. Foi uma direcção superior, fez justiça à partitura de Gounod e apoiou muito os cantores com algumas alterações nos tempos sem perturbar a narrativa vocal, permitindo que fossem sempre ouvidos.
A Orquestra e o Coro do Met estiveram, como sempre, ao mais alto nível.

Jonas Kaufmann, tenor alemão, foi um Faust extraordinário. A sua voz é de tenor lírico spinto mas consegue descer ao registo baritonal ou subir às notas mais agudas sem qualquer perda de qualidade. E fá-lo aparentemente sem esforço, sempre audível e sem estridência. A interpretação esteve repleta de frases de um lirismo invulgar, alguns pianíssimos de cortar a respiração, mezza voce ou voz forte e encorpada sempre que as passagens o exigiam. Foi também excelente a sua interpretação cénica, expressando curiosidade, desejo, arrependimento e desespero. As cenas com Marguerite foram marcantes e, no início, revelando algum cinismo também. É um artista completo e mais uma vez o demonstrou. A ária Salut! demeure chaste et pure no 3º Acto foi muito aplaudida mas as intervenções nos dois últimos actos foram arrebatadoras.



O soprano russo Marina Poplavskaya foi Marguerite. A cantora não está no grupo das minhas favoritas mas esta foi a sua melhor interpretação que assisti. Tem uma voz forte, dura e, por vezes, estridente para algumas das personagens que tem interpretado e, no presente caso, também assim penso. Começou mal mas conseguiu transmitir a inocência desejável à personagem. Também achei que melhorou vocalmente ao longo da récita. Artisticamente esteve muito bem, de frágil e pura a destroçada e enlouquecida no final. O pormenor do cabelo, longo e belo no início e curto e descuidado no fim foi muito bem conseguido.
Na ária Ah! Je ris de me voir, a célebre ária das jóias (que inspirou “As Jóias da Castafiore” de Tintin / Hergé), revelou algumas limitações técnicas. Contudo, esteve bem melhor no dueto amoroso do final do 3º acto e também muito bem no 5º acto.



René Pape, baixo alemão, foi um Méphistophélès assinalável. A voz é potente, cheia e grave, com alterações cromáticas ajustadas ao que canta. A figura e a encenação ajudam mas, apesar da sua presença dominadora, não foi tão maléfico e assustador como o vi anteriormente. Na ária Le véu d’or foi irrepreensível e teve várias outras intervenções de grande qualidade.


Valentin, irmão de Marguerite foi interpretado pelo barítono canadiano Russell Braun. A voz, bem audível, é igual a tantas outras. Artisticamente, na cena da morte após ter sido ferido por Faust, esteve muito bem.



Michèle Loisier, mezzo canadiano de voz bem timbrada, foi um Siebel de qualidade.


Este foi o quarto Faust que vi na presente temporada (e a este assunto voltarei brevemente).
Esta tarde foi mais um bom espectáculo na Gulbenkian.


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FAUST - Met Live in HD,  Gulbenkian Foundation, December 2011

Charles Gounod's Faust is a lyric opera in five acts with libretto by Jules Barbier and Michel Carré. The plot can be read here.

The staging at the Met was by Canadian director Des McAnuff. The action was set at the early twentieth century, the period between the two world wars. The philosopher Faust is here an old nuclear physicist who works in a lab where the atomic bomb is developed. He wants to commit suicide by drinking poison, but after invoking the devil he appears and he sells his soul to him. Then he comes from the middle of smoking, young, impeccably dressed and so will he continue until the final scene. Mephistopheles is dressed identically to Faust, but always wears a tie or a scarlet flower in his lapel.
The scenario is metalic, relatively empty, flanked by two spiral staircases with three loops that are continuously used in scenic movements. This approach is similar to the scenario that Jean-Louis Martinoty designed recently to Faust in Paris, as can be seen here.
This structure provides the basis for all the opera that benefits from frequent video projections.
In the 4th act, the arrival of the soldiers from the war and the meeting with their families was one of the most well done parts.In the end, Marguerite ascends to heaven on a stairway that appears on back center stage and Faust, old again, reappears in his lab and commits suicide by swallowing poison.
I confess that at first I did not like the staging but, with the course of the show, I realized that it finally worked, although without anything very innovative.

The musical direction was of the young Canadian conductor Yannick Nézet-Séguin. It was a superior direction, he has done justice to the score of Gounod and supported the singers with a few changes in tempi without disrupting the vocal narrative and allowing the singers to be always heard.
The Met Orchestra and Choir were, as always, at the highest level.

Jonas Kaufmann, German tenor, was an extraordinary Faust. His lyric spinto tenor voice is capable to descend to the baritonal register or to climb to top nnotes without any loss of quality. And he does it so seemingly effortless, always audible and without stridency. His singing was full of uncommon beautiful lyric parts, some breathtaking pianissimi, and either mezza voce or strong and full-bodied passages whenever adequate. Artistically he was also excellent, expressing curiosity, desire, regret and despair. The scenes with Marguerite were remarkable, also revealing some cynicism at the beginning. Kaufmann is a complete artist, and he confirmed that once again. The aria Salut! Demeure chaste et pure in the 3rd Act was very good but his singing in the last two acts was breathtaking.
Russian soprano Marina Poplavskaya was Marguerite. I confess that she is not one of my favourite singers but this was her best performance I attended. She has a strong hard voice, and sometimes strident for some of the characters that she interprets. She did not have a good start but she managed to convey the desirable character's innocence. I also think that she improved vocally over the performance. Artistically she was fine, fragile and pure at first, mad and shattered at the end. The detail of her hair, long and beautiful at the beginning, and short and careless at the end was very good.In the aria Ah! Je ris de me voir, the famous aria of the jewels (which inspired "The Castafiore Jewels" of Tintin / Hergé) she revealed some technical problems. However, she was much better in the love duet at the end of the 3rd act and she was also very well in the 5th act.

René Pape, German bass, was a remarkable Méphistophélès. The voice is powerful and with a beautiful low register, with colour changes adjusted to singing. The figure and the staging helped but, despite his constant commanding presence, he was not so evil and scary as I have seen him previously. In the aria Le veil d'or he was blameless and he had several other high-quality interventions.

Valentin, Marguerite's brother was interpreted by Canadian baritone Russell Braun. The voice, strong and with a nice timbre, is like many others. Artistically, at the death scene after being wounded by Faust, he was excellent.

Michèle Loisier, Canadian mezzo with a beautiful voice was a very good Siebel.

This was the fourth Faust I've seen this season (and I will come to this issue soon).
This afternoon was another good performance seen at the Gulbenkian Foundation.

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